sexta-feira, 10 de setembro de 2010

A VOZ DE ROMA

Vejamos, para nos apercebermos da força e arrogância desta confissão religiosa que, a todo o custo, sem que compreendamos, em nome de quem o faz, chama a si toda a autoridade que só reside, integralmente, em Deus ou na Sua Palavra!
Recentemente, o Papa João Paulo II publicou a Carta Apostólica Ad Tuendam Fidem, com o objectivo de acrescentar algumas normas no Código de Direito Canónico e no Código dos Cânones das Igrejas Orientais.
Citaremos, para não sermos longos, um ou outro dos acrescentos apontados pela Carta Apostólica referida: “No Cânone 1436 do Código dos Cânones das Igrejas Orientais acrescente-se o parágrafo 2 do Cânone 594, de tal forma que fique com a seguinte formulação:

Cânone 1436
a) Parágrafo 1:
Contém o seguinte articulado: “Aquele que nega uma verdade que por fé divina ou católica deve acreditar ou põe em dúvida, ou então repudia totalmente a fé cristã e, legitimamente avisado, não se retractar, seja punido como herege ou como apóstata com excomunhão maior (…)”. (sublinhado nosso).
No limiar do século XXI, o que será que esta ameaça quererá significar?

b) Parágrafo 2
“Fora estes casos, quem advogar uma doutrina definitivamente proposta ou condenada por errónea pelo Romano Pontífice ou pelo Colégio dos Bispos no exercício do magistério autêntico e, legitimamente admoestado, não se retractar seja punido com uma pena adequada”. (sublinhado nosso).
(No limiar do século XXI, o que será que esta ameaça quererá significar? Que o céu se pasme? Como se poderá ousar punir alguém que tenha um pendor espiritual qualquer? Será, perguntamos, lícito, punir o simples acto de respirar? Não estarão ao mesmo nível? Que incomoda se A ou B segue este ou aquele credo, desde que se comporte nos parâmetros da cidadania? O que dirá a área do Direito a este respeito? Seria interessante saber)!
“Estabelecemos que seja válido e ratificado tudo quanto Nós, com a presente carta apostólica escrita de moto próprio, decretámos e prescrevemos que seja inserido na legislação universal da Igreja Católica (…) não obstante tudo quanto haja em contrário”.
Perante o que acabamos de transcrever, isto é: “se não se retractar seja punido com uma pena adequada”? Perguntamos: o que será esta pena adequada? Quanto a nós, será um grande poço sem fundo, de grande abrangência, no campo das mentalidades! O mesmo será dizer, que se aplicará a qualquer circunstância, de não importa sob que clima mental! Nem mais nem menos, esta confissão religiosa continua igual ao que sempre foi, sempre acima de tudo e de todos, tal como no triste passado que a sua história, igualmente triste, não se cansa de proclamar!
O cristianismo oprimido da Igreja primitiva tornou-se numa força opressora e tudo em nome de Deus - quem diria? Para terminarmos, eis como se poderia definir o poder papal: “É só o Papa que recebe o Espírito santo, a inspiração normativa: da sua inspiração, da sua verbalização que ex cathedra proclama infalível, dependem todas as coisas deste soberbo edifício da instituição do sagrado direito canónico”.
Que terá em comum esta confissão religiosa com o cristianismo ou com o seu mentor - Jesus Cristo? São, efectivamente, duas faces da mesma moeda! Só que… feitas de metais diferentes!
Enfim, numa palavra de síntese: se fizéssemos tábua-rasa da data das afirmações acima transcritas, diríamos que recuámos no tempo, que entrámos na máquina do tempo e caímos numa época de trevas e de obscurantismo espiritual, ou seja, para melhor nos situarmos - em plena Idade Média – onde esta confissão religiosa comandou tudo e todos! Só porque ela era a única detentora do saber. A única que tinha acesso às escrituras! A única que ameaçava com o Inferno quem não obedecesse! E que faria aquele, mesmo o poderoso, nesta terra, contra tal ameaça – porque a tinha como verdadeira?
E tanto é assim, como já vimos, com o exemplo de Canossa, com o imperador Henrique IV da Alemanha (1056-1106)! Onde se veria hoje, devido ao conhecimento das Escrituras – graças a Deus por isso – um rei deslocar-se ao encontro do Papa. Este, no seu castelo, no bem-estar da lareira, e o monarca, cá fora, descalço na neve, a implorar, durante três dias, com vestes de penitente, o perdão papal! Se não fosse um facto histórico diríamos que tal ocorrência nunca teve lugar na história dos homens!
Dr. Ilídio Carvalho

Bibliografia:
Neste momento é a fonte que: “Vaticano saiu em defesa da fé Católica” in Jornal de Notícias, Lisboa, 08 de Julho de 1998, p. 22
Emil Brunner, La Doctrine Chrétienne de l’Église de la Foi et de l’Achèvement, Genève, Ed. Labor & Fides, 1967, Dogmática Vol. III, p. 96
John H. Taylor, Jr., O Comentário Bíblico, I e II Reis e II Crónicas, Lisboa, Ed. Jupec, 1984, p. 107
Catecismo, p. 460, nº 2130
Ibidem, nº 2132

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