segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

AS CHAVES INTERPRETATIVAS DO APOCALIPSE


O livro do Apocalipse é datado por volta do ano 96 de nossa era, quando já estavam escritos os Evangelhos do Novo Testamento. Os quatro Evangelhos – Mateus, Marcos, Lucas e João –, todos falam a respeito da primeira vinda do Messias Jesus e se concentram em sua vida, sua missão e morte, sua ressurreição e sua ascensão. Aí terminam os quatro Evangelhos. Mas o livro do Apocalipse começa depois de sua ressurreição, com Cristo exaltado à mão direita do Pai, levando a cabo sua obra de intercessão em preparação para sua volta. Desse modo, o Apocalipse se concentra sobre sua mediação em favor da igreja durante a era cristã e em sua obra final de juízo e libertação como a introdução para seu segundo advento. O Apocalipse é o complemento dos quatro Evangelhos. É o único livro revelado por Cristo diretamente do céu. Ele o chama seu próprio "testemunho destas coisas nas igrejas" (Apoc. 22:16). Em sentido especial, o livro do Apocalipse é o testemunho de Jesus e o testemunho do Espírito (V. 17; 2:7, 11 ).
A primeira chave
Que chaves temos para decifrar seu simbolismo apocalíptico? A primeira chave interpretativa se apresenta virtualmente em cada versículo do livro. A edição grega do Novo Testamento indica que o Apocalipse contém mais de 600 alusões aos escritos do Antigo Testamento. A Bíblia Hebraica continua sendo o fundamento e a raiz do Novo Testamento, e só quando mantemos juntos ambos os Testamentos temos a Bíblia completa. Em grande parte, o Antigo Testamento é profecia e o Novo Testamento proclama o seu cumprimento em Cristo e em seu povo. Não podemos entender completamente um sem o outro. O fato de que o Apocalipse se refira mais de 600 vezes à história do Antigo Testamento e a seus conceitos hebraico, sugere que o Antigo Testamento é a primeira chave para decifrar o livro do Apocalipse.
Em seu livro Atos dos Apóstolos, Ellen White declara que "no Apocalipse todos os livros da Bíblia se encontram e se cumprem" (p. 585). Essa é uma declaração teológica profunda e fascinante! Todos os outros livros da Bíblia, 65 em total, encontram seu significado recôndito e sua consumação no Apocalipse. Isto quer dizer que os livros de Moisés, os profetas, e também os Salmos, encontram sua aplicação final no livro do Apocalipse. Significa que todos os atos históricos de Deus em salvação e juízo voltarão a acontecer em uma escala mundial.
O fato de que o Antigo Testamento seja a chave para o Apocalipse tem sido reconhecido hoje em dia como um descobrimento importante na história dos estudos apocalípticos. Não obstante, alguns intérpretes até tratam de explicar o livro do Apocalipse por si mesmo, torna literal as palavras e imagens como se fossem fotografias atuais de eventos futuros. Por conseguinte, o centro de atenção muda imediatamente para longe de Cristo ao povo judeu no Oriente Médio e a outros eventos políticos. O monte Sião em Apocalipse 14 se aplica a um monte literal em Jerusalém. Este enfoque se chama literalismo. Outros foram ao extremo oposto segundo o qual cada símbolo se explica especulativamente, sem nenhuma norma bíblica. Esse enfoque se chama alegorismo. Tanto o literalismo como o alegorismo são especulações injustificadas.
A única chave que decifra o significado recôndito do Apocalipse é a chave que o mesmo livro indica. Seus conceitos simbólicos e seus termos estão tirados do Antigo Testamento. Ali encontramos o significado dos símbolos apocalípticos em seu marco do pacto original e da história da salvação. No Antigo Testamento encontramos os protótipos na história do que Deus vai fazer no futuro. Deus revela o futuro mostrando-nos como atuou no passado. Diz ao povo de Cristo que têm um sublime chamado e um grande futuro, devido ao que Deus prometeu no passado.
O Apocalipse destaca a autoridade de Cristo ao declarar que é "a revelação do Jesus Cristo, que Deus lhe deu" (1:1). O que é que quer dizer por Deus"? O Deus do pacto, o Deus de Israel, o Deus de Abraão, Isaque e Jacó. O Deus do pacto está falando agora "para manifestar a seus servos as coisas que devem acontecer logo" (v. 1). Estas palavras: "que devem acontecer logo", com exceção da palavra "logo", todas estão citadas de Daniel. Estando perante Nabucodonosor, o rei de Babilónia, disse Daniel: "Mas há um Deus nos céus, o qual revela os mistérios, e ele tem feito saber ao rei Nabucodonosor o que tem que acontecer nos últimos dias" (Dan. 2:28). Estas palavras se repetem como o tema do Apocalipse. Entretanto, João acrescenta a palavra "logo" (Apoc. 1:1). Isto nos diz que a primeira vinda de Cristo levou a expectativa da esperança de Daniel muito mais perto de sua realização histórica.
Para apreciar o cumprimento da profecia do Daniel, devemos saber em que tempo recebeu a visão. Daniel viveu durante o Império Neobabilônico (604-539 a.C.). No capítulo 2, Daniel revela uma visão que Deus deu ao rei Nabucodonosor. Consistia de uma estátua metálica feita de quatro metais: uma cabeça de ouro; seu peito e seus braços de prata; seu ventre e suas coxas de bronze; suas pernas de ferro; os pés, em parte de ferro e em parte de barro cozido, um fundamento muito frágil para uma estátua tão pesada.
Esta é uma revelação de como Deus vê o curso da história do mundo, com a humanidade erguida sobre pés de barro. Entretanto, no quadro vivo de Daniel, Deus tem uma parte. Duas vezes se destaca que uma pedra foi cortada "sem intervenção humana" (Dan. 2:34, 45, NBE), indicando que o homem não tem nada que ver com o destino final do mundo. No tempo indicado por Deus, descerá uma rocha do céu, dirigindo-se para o planeta terra. A estátua simboliza nosso mundo em sua história política do tempo do profeta Daniel. Começando com Babilónia, apresenta os impérios sucessivos de Medo-pérsia, Grécia- Macedónia, para ser seguidos pela autoridade de ferro do Império Romano que durou desde ano 164 a.C. até 476 d.C. Depois disso viria um mundo "dividido" (v. 41).
Hoje em dia não existe um governo mundial, embora alguns tentaram fazê-lo pela força durante os últimos séculos, incluindo Carlos Magno, Napoleão e Hitler. Nossa situação mundial presente está surpreendentemente representada pelos pés da estátua da profecia. Somos testemunhas da época avançada na história do mundo, tal como se esboça em Daniel 2.
Deus é o Senhor da história, e por meio de Cristo a levará a sua conclusão decretada. Quando Cristo venha pela segunda vez, terminará com todas as estruturas políticas de poder, tal como se prediz em Daniel 2:44 e 45. Deus não é um espectador da história mundial; ele guia e dirige ativamente o fluir da história para seu destino, seja que lhe ajudemos ou não. Em Apocalipse nos volta a assegurar que tudo será novo: "Eis aqui eu faço novas todas as coisas" (Apoc. 21:5).
Nenhuma comunidade pode restaurar o paraíso. O Apocalipse começa com a garantia de que a predição de Daniel acontecerá "logo"! Há uma nova oportunidade em Apocalipse que não está presente em Daniel.
Uma indicação adicional desta urgência do fim do tempo é o fato de que o rolo do Daniel estava "selado" até o tempo do fim (Dan. 12:4). Daniel 8 foi selado explicitamente para "um futuro remoto" (8:26, NBE). Daniel não escreveu para seu próprio tempo. Suas visões ficaram seladas porque eram para as gerações futuras. Por outro lado, o livro do Apocalipse termina com esta ordem direta: "Não sele as palavras da profecia deste livro, porque o tempo está perto" (Apoc. 22:10). Portanto, o livro selado de Daniel fica aberto gradualmente no Apocalipse. Isto significa que um não pode entender o livro do Apocalipse sem entender suas raízes em Daniel. Isto se confirma pela primeira declaração que faz João do tema fundamental do Apocalipse:
"Eis que vem com as nuvens, e todo olho o verá, até quantos o traspassaram. E todas as tribos da terra se lamentarão sobre ele. Certamente. Amém!" (Apoc. 1:7).
Esta linguagem figurada por si mesma não dá a conhecer todo seu profundo significado. A chave para entender seu significado se encontra na Bíblia Hebraica! A raiz central primária do Antigo Testamento de Apocalipse 1:7 é Daniel 7. Este capítulo de Daniel constitui a visão apocalíptica principal para o livro do Apocalipse. Daniel mesmo ficou profundamente comovido pelo que ouviu e viu. Sua nova visão ampliou sua predição profética anterior do capítulo 2. Agora se descrevem os quatro metais da estátua em Daniel 2 como quatro bestas insólitas que surgem do mar das nações como impérios mundiais, em forma sucessiva. Depois segue uma nova revelação que desenvolve o significado da pedra que cai do céu e esmiúça a estátua.
A segunda chave
Escreve Daniel: "Eu estava olhando nas minhas visões da noite, e eis que vinha com as nuvens do céu um como o Filho do Homem" (Dan. 7:13). Esta representação específica forma a fonte da proclamação de João em Apocalipse 1: "Eis que vem com as nuvens, e todo olho o verá" (v.7). Na visão de Daniel, o semelhante a um filho de homem, o ser celestial, foi até o "Ancião de Dias" (Dan. 7:13).
"Foi-lhe dado domínio, e glória, e o reino, para que os povos, nações e homens de todas as línguas o servissem; o seu domínio é domínio eterno, que não passará, e o seu reino jamais será destruído" (Dan. 7:14).
Esta coroação celestial do Messias celestial em Daniel 7 desenvolve o centro culminante em Daniel 2 onde a rocha cortada "sem intervenção humana" investe contra a estátua, pulveriza-a e é levada pelo vento de maneira que não fica nada a não ser a rocha, que chega a ser o paraíso restaurado. Dessa forma, tanto no capítulo 2 como no 7, o profeta nos assegura que o reino de Deus será restaurado sobre a terra.
Há algo muito importante que se desenvolve entre o Daniel 2 e 7. A pedra de Daniel 2 chega a ser o Messias, representado como "um como um filho de homem", em contraste com as "bestas" ímpias do capítulo 7. Esta revelação assombrosa revela que no céu há outro personagem celestial além de Deus o Pai, um de aparência divina, que aparece sobre um carro de nuvens celestial: "Com as nuvens!" Estas devem representar as nuvens de anjos celestiais. A linguagem figurada de "nuvens" indica uma aparência divina (ver Êxo. 13:21; 14:19; 19:16; 40:34; Lev. 16:2; Núm. 9:15-23; Sal. 104:3; Isa. 19:1; Deut. 33:26). O Messias divino virá para julgar e restaurar (Dan. 7:22). O Pai lhe dá todo o domínio sobre a terra. Este Messias governará nosso mundo de parte de Deus. Declara Daniel:
"O reino, e o domínio, e a majestade dos reinos debaixo de todo o céu serão dados ao povo dos santos do Altíssimo" (Dan. 7:27).
Aqui lemos que os santos receberão o reino de Deus. Esse "reino será reino eterno, e todos os domínios o servirão e lhe obedecerão" ao divino Filho de Homem (7:27). Dessa maneira Deus transfere no céu ao Messias divino toda a autoridade e o poder soberano sobre nosso planeta.
O Filho de Homem celestial deve provir do céu e dirigir-se à Terra. Nesse ponto, Apocalipse 1 continua e supera Daniel 7. Apocalipse 1 anuncia: "Eis que vem com as nuvens". Virá "logo" a nossa terra: "E todo olho o verá" (v. 7). Esta não é uma vinda espiritual, invisível, porque até os incrédulos em todo mundo verão sua vinda. Significa o glorioso reaparecimento do Senhor Jesus Cristo ressuscitado (ver também At. 1:9-11; Heb. 9:28).
Para os judeus, o Messias era primordialmente um personagem político e militar. Jesus não desejava confirmar estas expectativas messiânicas (João 6:15). Distanciou-se da imagem messiânica prevalecente em seus dias e escolheu um símbolo do Antigo Testamento que não estava carregado com essa interpretação errónea. Jesus se chamou a si mesmo "o Filho do Homem". Mudou a expressão de Daniel de "um como um filho de homem" a um termo messiânico mais explícito. Cristo se chamou a si mesmo em repetidas ocasiões "o Filho do Homem". De fato aparece assim 77 vezes nos quatro Evangelhos.
A frase "o Filho do Homem" não quer dizer que Jesus foi meramente um homem. Cristo explica a designação da visão de Daniel 7: "Pois para que saibam que o Filho do Homem tem poder na terra para perdoar pecados, te digo: levante-te" (Mar. 2:10, 11). Aqui Cristo se chamou a si mesmo "o Filho do Homem". Como o filho de homem em Daniel, tem o poder para perdoar pecados. Nenhum sacerdote Levítico disse nunca: "Perdoo teus pecados". Não há nenhum pastor protestante que afirme: "Perdoo seus pecados". Só o sacerdote católico romano afirma: "Perdoo seus pecados" ("Ego te absolvo"). Segundo a Sagrada Escritura só Deus pode perdoar nossos pecados (Sal. 32:5; Isa. 43:25). Por isso, quando o "filho de homem" de Daniel 7 vem para perdoar pecados, a frase "Filho do Homem" significa o Messias celestial ou "Filho de Deus" (ver João 5:27). Só à luz de Daniel 7 podemos entender que o Filho do Homem é o Messias divino com autoridade igual à de Deus o Pai.
Quando o Apocalipse enfatiza que Cristo logo voltará, isto são boas novas para os seguidores de Jesus. Virá para executar seu juízo sobre os ímpios. Se pela fé "estamos em Cristo" não temos nada a temer, porque Cristo já nos livrou que a condenação divina (Rom. 8:1). Em realidade, devemos recebê-lo com satisfação e desejar juiz divino, como insígnia o livro de Salmos. No Salmo 96 todas as árvores do bosque "transbordam de contente", porque Deus deve julgar o mundo com justiça (vs. 11-13).
O Apocalipse proclama que todos os que estão sobre a terra serão testemunhas de sua segunda vinda, até aqueles que o "transpassaram". Esta expressão se refere claramente à morte de Jesus. Jesus foi transpassado pela lança de um soldado romano. Do corpo de Jesus fluiu água e sangue (João 19:34, 37). Mas em um sentido especial todos os oponentes principais de Cristo Jesus na história estão incluídos em "os que o transpassaram" por meio das "lanças" de suas palavras e ações.
Esta frase também tem sua raiz principal no Antigo Testamento. O profeta Zacarias havia predito antes que Jerusalém "transpassaria" a seu próprio Messias Pastor e então todas as tribos do Israel se afligiriam por ele (Zac. 12:10-14; cf. 9:9; 13:7). O cumprimento das predições de Zacarias começou quando Cristo apareceu pela primeira vez, durante sua entrada triunfal em Jerusalém como seu Messias Rei (ver Mat. 21:4, 5). Uma semana mais tarde Jesus anunciou que agora todas as suas ovelhas seriam dispersas, como havia predito Zacarias (ver Mat. 26:31). Zacarias predisse que Jerusalém rechaçaria e "transpassaria" a seu Messias:
"E olharão para mim, a quem traspassaram; e o prantearão como quem pranteia por um unigénito; e chorarão amargamente por ele, como se chora amargamente pelo primogénito" (Zac. 12:10).
Jesus recalcou que as doze tribos de Israel "se lamentariam" (Zac. 12:12-14). Este pranto nacional incluso ainda não se realizou na nação judaica. Apocalipse 1 faz esta aplicação ampliada:
"Eis que vem com as nuvens, e todo olho o verá, até quantos o traspassaram. E todas as tribos da terra se lamentarão sobre ele. Certamente. Amém!" (Apoc. 1:7).
Isto significa que todos os povos da terra se lamentarão com desespero quando vier pela segunda vez, "por causa dele". O Apocalipse desenvolve esta cena com mais dramatismo em suas visões seguintes (ver 6:15-17; 14:14-20; 19:11-21). A importância deste ponto culminante no Apocalipse fica sublinhada pelas palavras proféticas de Jesus no Evangelho de Mateus:
"Então, aparecerá no céu o sinal do Filho do Homem; todos os povos da terra se lamentarão e verão o Filho do Homem vindo sobre as nuvens do céu, com poder e muita glória" (Mat. 24:30).
Porque "todo olho" o verá e "todas as tribos" ou povos da terra farão lamentação por ele; ninguém que rechace a Cristo na geração final será capaz de esconder-se deste glorioso Rei-Juiz no último dia.
Resumo
Sintetizando os descobrimentos desta investigação, o Apocalipse revela duas chaves específicas de interpretação para decifrar seus conceitos simbólicos:
A primeira chave é que seu simbolismo está copiado do Testamento mais antigo, a Bíblia Hebraica. Isto mantém a continuidade do Deus do pacto com seu verdadeiro Israel. A palavra de Deus não foi anulada devido à rebelião de Israel. O Messias de Deus apareceu em Israel e cumpriu sua missão (ver Mar. 10:45 e João 19:30).
A segunda chave é a verdade evangélica que se encontra nos quatro Evangelhos do Novo Testamento: o crucificado e ressuscitado Jesus de Nazaré é o Messias da profecia. Isto significa que todos os termos e as imagens do antigo pacto estão agora refundidas na linguagem figurada do novo pacto que está centrado em Cristo. Um erudito católico romano ficou tão impressionado pela "releitura cristã do Antigo Testamento" feita por João, que concluiu: "Agora perece que este uso deliberado do Antigo Testamento que faz o autor do Apocalipse deveria estudar-se mais cuidadosamente do que foi estudado até agora".[1]
Devem estudar-se múltiplas conexões do Apocalipse com o Antigo Testamento, não para mostrar a maneira como João engenhosamente adaptou os símbolos e as profecias hebraicas, a não ser para entender de que maneira o Deus de Israel consumará suas promessas que fez no antigo pacto por meio de Cristo e seu povo do novo pacto.
Hans K. LaRondelle
Referência
1. André Feuillet, The Apocalypse [O Apocalipse] (Staten Island, Nova York: Alvorada House, 1965; da ed. francesa [Paris: Desclée deo Brouwer, 1962]), p. 79.
 

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

A COMPOSIÇÃO LITERÁRIA DO APOCALIPSE


O Apocalipse contém um plano arquitectónico detalhado na sua estrutura literária que até recentemente foi passado por alto. Um erudito moderno declara que "a chave para entender uma obra é a sua forma literária". [1] Enquanto o Apocalipse é apreciado como uma obra de poesia e é considerado como um poema artisticamente engenhoso, João não compôs o livro por amor à arte. O propósito foi "sublinhar os diferentes aspectos da mensagem teológica do livro". [2] Isto implica que o plano literário é uma parte essencial do ensino de João. Até C. Mervyn Maxwell conclui dizendo que o desenho simétrico do Apocalipse proporciona "uma das chaves mais valiosas para abrir o significado do livro". [3]
A relação da forma literária e o conteúdo teológico requer que o leitor preste atenção cuidadosa à estrutura do livro. Revela algumas pautas inerentes para interpretar o Apocalipse. O Apocalipse de João está construído de acordo com o modelo de um paralelismo inverso, comparável aos braços correspondentes de um candelabro ou menorá, no qual os braços da parte esquerda são paralelos aos da direita. Este modelo simétrico divide o Apocalipse em duas divisões principais, sugerindo um tema duplo no livro: a presença continuada de Cristo e a sua gloriosa segunda vinda (Apoc. 1:7, 8, 17, 18; 22:12, 13). Conclui Kenneth Strand dizendo que:
"A primeira parte e a maior do livro (caps. 1-14) trata sobre quem é o Alfa e o Omega, o protetor e sustentador do seu povo apesar das provas e perseguições que possam surgir no seu caminho. A segunda maior parte do livro, começando com o capítulo 15, trata dos juízos escatológicos que se agrupam e se centram na consumação da era: a segunda vinda de Cristo".[4]


O Apocalipse pode dividir-se de uma maneira diferente se se aplicarem outros pontos de vista que não sejam os do fim do tempo de graça. É possível ver as visões do tempo do fim começando já no capítulo 10, com referência à chamada final do céu para ter um povo que deve subsistir firme contra o império do anti-cristiano. Mas é um fato ineludível que o livro está organizado em duas grandes divisões que se correspondem mutuamente. Vamos vê-lo em cinco aspectos bem vincados:
 
1. A primeira indicação deste modelo literário é a natureza paralela do prólogo (Apoc. 1:1-8) e do epílogo (22:6-21). Em ambas as seções se fala de um anjo enviado por Deus para mostrar a seus servos "as coisas que devem acontecer logo" (1:1 e 22:6). Ambas as partes contêm a mesma bem-aventurança para os que ouvem a profecia de João (1:3 e 22:7). Além disso, Apocalipse 1:2 explica que o livro contém "a palavra de Deus e o testemunho de Jesus Cristo", e o epílogo conclui: "Eu Jesus, enviei meu anjo para lhes dar testemunho destas coisas nas igrejas" (22:16). Ambas as seções mencionam o tema dominante da volta de Cristo (1:7 e 22:7, 12, 20). As duas vezes lêem que "o tempo está perto" (1:3 e 22:10). No prólogo, Deus é chamado o Alfa e o Omega (1:8), enquanto que o epílogo descreve a Cristo como o Alfa e o Omega (22:13). Além de tudo isto, ambas as seções mencionam o Espírito como parte da Deidade (1:4, 5 e 22:6, 9, 16, 17).
Estas correspondências revelam que o prólogo e o epílogo formam um modelo deliberado de

quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

A VISÃO DO TRONO DO CRIADOR - Apocalipse 4



O Cristo ressuscitado chama agora a João para que suba no Espírito para ter uma nova visão e um olhar dentro do céu (Apoc. 4:1). O Espírito lhe permite ver através de "uma porta aberta" na sala do trono do Todo-poderoso. Tal privilégio foi concedido só a poucos servos de Deus, tais como Miqueias (1 Reis 22:19-22), Isaías, Ezequiel e Daniel. Enquanto Isaías estava adorando no templo de Jerusalém tinha visto Deus sentado em um trono no céu, rodeado por serafins e anjos. Esses guardiões do trono estavam louvando a Deus cantando: "Santo, santo, santo, Jeová dos exércitos; toda a terra está cheia de sua glória" (Isa. 6:3).
 
Enquanto estava cativo em Babilónia, também foi permitido ao profeta e sacerdote Ezequiel ver os céus abertos. Conta que viu a semelhança de 4 criaturas viventes sustentando o trono de Deus. Esses seres levavam o trono semelhante a uma carruagem para Jerusalém para convocar a cidade apóstata diante do divino Juiz. Descreve os 4 seres como tendo 4 asas e 4 rostos que se pareciam com os rostos de um homem, um leão, um boi e uma águia (Ezeq. 1:5, 6, 10). Sobre as cabeças dos 4 portadores do trono, Ezequiel viu "uma expansão a maneira de cristal maravilhoso" (v. 22) e ainda por cima daquele firmamento, "a figura de um trono" com alguém sentado sobre ele que tinha "a forma de homem" (v. 26). Ao redor do trono viu um arco-íris (v. 28). O impacto dessa visão do trono foi tão entristecedora que Ezequiel diz que ao contemplá-la "caí com o rosto em terra" (v. 28, NBE).
 
Quando João estando em Patmos descreve sua visão do trono, usa palavras que fundem as duas visões anteriores de Isaías e Ezequiel. Embora contemple a majestade do Deus de Israel, só descreve a Deus por sua aparência de brilho que resplandecia como o "jaspe" e a vermelha "cornalina" [BJ]. Além disso, vê um halo em forma de um arco-íris, semelhante em aspecto à esmeralda, ao redor do trono (Apoc. 4:3), como se queria significar que a graça divina rodeia a justiça omnipotente. João também vê 4 criaturas viventes ao redor do trono que se parecem com os que Ezequiel havia descrito (vs. 6, 7). Entretanto, João os combina com os serafins da visão de Isaías, porque diz que cada ser

segunda-feira, 26 de novembro de 2012

A ENTRONIZAÇÃO DO CORDEIRO DE DEUS - Apocalipse 5


O propósito do Apocalipse de João é revelar as coisas que "devem acontecer" (Apoc. 1:1, 19; 4:1). De modo surpreendente, o que João vê agora em visão, não trata a respeito do que ia passar na terra e sim o que estava acontecendo no céu! A razão para este notável ponto central de atividade em Apocalipse 4 e 5 pode encontrar-se na revelação de que as decisões na sala do trono celestial determinam o curso da história humana, tal como o surgimento e a queda dos governos humanos, mas acima de tudo, o destino final do mundo. Daniel tinha assinalado a soberania de Deus sobre a humanidade: "Ele muda os tempos e as idades; tira reis e põe reis" (Dan. 2:21; ver também 4:17; 5:18, 26-28). Depois da devastação de Jerusalém, Jeremias assegurou aos judeus: "Mas tu, Jeová, permanecerás para sempre; teu trono de geração em geração" (Lam. 5:19). Jesus se submeteu ao poder brutal do governador romano Pilatos, mas declarou: "Nenhuma autoridade teriam contra mim, se não fosse dada de acima" (João 19:11).
Agora o Soberano no céu revela a João um esboço da era da igreja, com ênfase especial sobre o resultado final como está determinado por sua vontade soberana. Este futuro se centra em Cristo e em seu povo do pacto, e se revela por meio da visão do "livro" de Apocalipse 5 a 7.
O livro divino [biblíon] em Apocalipse 5 está selado com 7 selos que ninguém nem no céu nem na terra é digno de abrir. Isto é altamente significativo. Nenhum ser criado, seja anjo ou santo, tem a dignidade de Jesus exaltado. Só Cristo pode dar a conhecer os juízos de Deus, abrindo os selos (Apoc. 6 e 7), e pelas visões seguintes e esclarecedoras do Apocalipse. Desse modo Cristo dá sentido à história mundial. Ele colocou a humanidade em direção a uma meta que Deus predeterminou na sua sala do trono no céu. Por isso as visões do trono de João são fundamentais para todo o livro. G. R. Beasley-Murray percebeu isto e disse: "Neste particular, estes capítulos [Apoc. 4 e 5] constituem o fator fundamental da estrutura que mantém unido o livro, porque o resto das visões são montadas nesta estrutura principal".1
A ênfase sobre o livro divino na mão direita de Deus amplia o foco de Deus como o Criador em Apocalipse 4 para Deus como o Redentor de sua criação. A visão do trono no capítulo 5 revela a maneira na qual Deus "tem que vir" (Apoc. 4:8) na história da humanidade para cumprir seu propósito. A Majestade sobre o trono tem em sua mão direita um livro escrito em ambos os lados, e selado com 7 selos (5:1). Alguns viram aqui uma similitude com o rolo do livro desdobrado que Ezequiel recebeu de Deus, no qual estavam escritas por diante e por trás "lamentos e lamentações e ais" (Ezeq. 2:9, 10). Outros vêem um paralelo mais adequado com o rolo de Deuteronómio, o qual, como o livro do pacto, devia dar-se a um recém-coroado rei em Israel (ver Deut. 17:18-20; 2 Reis 11:12). Em sua tese, Ranko Stefanovic tira esta ampla conclusão:
 
"Ao tomar o livro, a Cristo lhe encomendou a soberania do mundo (cf. 1 Ped. 3:22; Fil. 2:9-11); o livro significaria então a legítima transferência do reino. Em tal contexto, também tem um caráter de testamento, e pode chamar-se também o livro da herança de Cristo. Desde que a transferência do reino se refere à recuperação da posse do direito que se perdeu pelo pecado, o livro tem todas as características do livro da redenção ou a escritura da venda. Ao tomar o livro, todo o destino da humanidade se coloca nas mãos do Cristo entronizado; por isso é na verdade o livro celestial do destino. Ele julgará sobre a base de seu conteúdo, por isso é o livro de juízo".2
O conteúdo deste livro selado, descrevendo os juízos de Deus sobre um mundo hostil, como aparece pelos capítulos que seguem, coloca-se nas mãos do Senhor ressuscitado, o Cristo todo-poderoso e omnisciente (ver Apoc. 5:6). Apocalipse 5 assegura que por meio da vitória de Cristo na terra, será restaurado o reino de Deus (ver Apoc. 21:5).
"Todavia, um dos anciãos me disse: Não chores; eis que o Leão da tribo de Judá, a Raiz de Davi, venceu para abrir o livro e os seus sete selos. Então, vi, no meio do trono e dos quatro seres viventes e entre os anciãos, de pé, um Cordeiro como tendo sido morto. Ele tinha sete chifres, bem como sete olhos, que são os sete Espíritos de Deus enviados por toda a terra. Veio, pois, e tomou o livro da mão direita daquele que estava sentado no trono" (Apoc. 5:5-7).
Um dos santos glorificados no céu explica que as promessas de Deus a Israel encontraram seu cumprimento no Senhor ressuscitado, e se refere a três profecias essencialmente messiânicas e as combina em uma proclamação de cumprimento: Géneses 49:9, 10; Isaías 11:1-10 e 53:7. "Em nenhum outro lugar no Novo Testamento estão agrupados os termos reais mais significativos em

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

OS 5 PRIMEIRO SELOS DO APOCALIPSE - Apocalipse 6

Os comentadores da Bíblia com frequência equiparam a estrutura paralela dos 7 selos em Apocalipse 6 com o discurso profético de Jesus nos Evangelhos sinópticos. Beasley-Murray fala por muitos quando diz: "Nenhuma passagem no Novo Testamento está mais intimamente relacionado a este elemento [os selos] dentro do livro do Apocalipse que o discurso escatológico dos Evangelhos, Marcos 13 e as passagens paralelos (Mat. 24 e Luc. 21)".1 Colocando as duas sequências proféticas em forma paralela, elas mostram que os 7 selos apresentam as mesmas características e a mesma ordem consecutiva do discurso do Monte das Oliveiras.
Esta comparação mostra que devemos considerar os selos consecutivos em Apocalipse 6 como a exposição ulterior de Cristo de seu discurso anterior no que tinha resumido a seus discípulos o que lhes aconteceria durante sua missão no mundo. Isto significa que os selos predizem não só os juízos do tempo do fim mas também os juízos messiânicos durante toda a época da igreja. Em Mateus 24 Jesus adoptou o estilo apocalíptico de Daniel de repetição e ampliação. Duas vezes Jesus começou seu esboço com sua própria geração e depois passou rapidamente adiante na história até o fim da era da igreja, como se pode ver por Mateus 24:1-4 e 24:15-31. Jesus anunciou que as guerras que viriam, as fomes, as perseguições e a apostasia não precederiam imediatamente a sua volta:

"Quando ouvirdes falar de guerras e revoluções, não vos assusteis; pois é necessário que primeiro aconteçam estas coisas... E cairão a fio de espada e para todas as nações serão levados cativos; e Jerusalém será pisada pelos gentios, até que os tempos dos gentios se completem" (Luc. 21:9, 24).
Jesus lhes advertiu especificamente contra uma expectativa iminente:
"Respondeu ele: Vede que não sejais enganados; porque muitos virão em meu nome, dizendo: Sou eu! E também: Chegou a hora! Não os sigais" (Luc. 21:8).
Se os selos desenvolvem em forma adicional Mateus 24, então os selos igualmente se estendem sobre

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

ABERTURA DO 6º E 7º SELO - APOCALIPSE


(Apoc. 6:11-14)
6º Selo
Menciona o sexto selo dois terremotos diferentes, um local (Apoc. 6:12) e um cósmico (v. 14)? Nem a sétima trombeta nem a sétima praga mencionam dois terremotos. Em Mateus 24, Jesus não se referiu a nenhum terremoto particular no tempo do fim. Entretanto, a resposta a nossa pergunta pode encontrar-se no mesmo contexto do sexto selo. O estilo literário de Apocalipse 6:12-14 e 15-17 assinala a seu significado. A primeira unidade dos versículos 12-14 mostra o modelo do ABB1A1, a estrutura típica do paralelismo inverso:
A. Há um grande terremoto.
B. O sol, a lua e as estrelas funcionam mau.
B1. O céu se desvanece como um pergaminho que se enrola.
A1. Todo monte e toda ilha se remove de seu lugar.
O argumento literário descreve uma sacudida do céu e da terra, exatamente como haviam predito Ageu (2:6) e Hebreus (12:26, 27). "Porque assim diz Jeová dos exércitos: daqui a pouco eu farei tremer os céus e a terra, o mar e a terra seca". Nenhum terremoto local pode igualar a finalidade e as dimensões universais das descrições de Ageu, de Hebreus e a do sexto selo.
Apocalipse 6:12-14 descreve em primeiro lugar os sinais cósmicos na terra e no céu (A e B); depois continua descrevendo os efeitos destes sinais na ordem inversa: no céu (B1) e na terra (Ao terremoto mencionado em "A" é a origem dos efeitos universais mencionados em "A1: o desaparecimento dos montes e das ilhas. Uma descrição similar de causa e efeito pode ver-se na sétima praga, onde se menciona primeiro um terremoto tremendo e universal (ver Apoc. 16:18), seguido por seu efeito sobre Babilônia e sobre os montes e as ilhas (vs. 19, 20). A descrição da sétima praga é um paralelo literário surpreendente com a do sexto selo! Precisamos entender ambos da mesma maneira. Este paralelo indica que o sexto selo não projeta dois terremotos diferentes, com centenas de anos entre eles (em Apoc. 6:12-14).
Para entender a composição literária que João apresenta dos cataclismos no céu durante o sexto selo, é instrutivo observar sua adoção da descrição que faz Isaías do juízo mundial devastador de Deus:
"Todo o exército dos céus se dissolverá, e os céus se enrolarão como um pergaminho; todo o seu exército cairá, como cai a folha da vide e a folha da figueira" (Isa. 34:4).
"Porque as estrelas dos céus e os astros não deixarão brilhar a sua luz; o sol se escurecerá ao nascer, e a lua não fará resplandecer a sua luz...  Pelo que farei estremecer os céus; e a terra se moverá do seu lugar, por causa do furor do Senhor dos Exércitos e por causa do dia da sua ardente ira" (Isa. 13:10, 13).
Nesta linguagem figurada tão vívida que formula os aspectos espantosos do dia do Senhor, não temos à vista uma ordem de acontecimentos e tampouco há indicação bíblica de que o sexto selo tenha o propósito de ensinar uma ordem específica de eventos (ver no cap. VI a seção "A teologia de Cristo dos sinais cósmicos").
Na unidade seguinte (Apoc. 6:15-17), João descreve o impacto universal do estremecimento cósmico sobre o mundo político, militar, económico e social. Em vão tratam de procurar refúgio ante o Juiz da terra.
Dessa maneira o sexto selo descreve a ordem progressiva de causa e efeito. Se compararmos as descrições do terremoto apocalíptico do Apocalipse, observamos uma ampliação gradual do mesmo na sétima trombeta e na sétima praga:
 
Este desenvolvimento progressivo do terremoto cósmico não é, obviamente, a predição de dois ou mais terremotos. A composição literária do Apocalipse ensina um terremoto final e cósmico, que se amplia na descrição de cada série seguinte, em harmonia com a crescente severidade dos juízos das trombetas e as pragas à medida que se aproxima o fim.
É significativo que João se apropria em forma consistente das antigas profecias do dia do Senhor para sua descrição do sexto selo. Isto é especialmente verdade de sua adopção dos sinais cósmicos de Isaías (13:10, 13; 24:18, 19, 23; 34:4, 8) e do Joel (2:10, 11, 30, 31; 3:14-16). João não encontrou nos profetas uma lista uniforme de sinais cósmicos! Inclusive troca o arranjo de sua fonte principal, Isaías 34:4, em sua própria descrição em Apocalipse 6:12-14. A preocupação dominante de João não é criar uma ordem cronológica determinada de sinais cósmicos, a não ser colocar ao redor de Cristo como o novo centro e meta dos cataclismos finais no universo, em harmonia com o próprio entendimento de Jesus em Mateus 24:29-31. Este empréstimo penetrante do Antigo Testamento destaca a unidade teológica de ambos os Testamentos e seu panorama apocalíptico comum. Ambos os Testamentos revelam um Criador-Redentor e um dia de juízo (ver Heb. 1:1, 2; Apoc. 6:17).
 
Em conclusão, o sexto selo não pode ser entendido corretamente por si mesmo, divorciado dos cinco selos anteriores. O sexto selo é a consumação dos selos anteriores. O clamor dos mártires por vindicação foi respondido só em um sentido preliminar com a vindicação celestial ("as vestimentas brancas") sob o quinto selo. Têm que "esperar um pouco de tempo", até que se complete a tribulação do tempo do fim para o povo de Deus (Apoc. 6:11). O sexto selo não se abre com outro período de espera para os santos mortos e vivos, a não ser com a chegada do dia de ajuste de contas, o dia de justiça e vindicação.
O Sétimo Selo
O sétimo selo não acrescenta nenhum evento adicional, só "silêncio no céu como por meia hora" (Apoc. 8:1). Este silêncio sugere que a justiça de Deus foi plenamente apoiada sobre as expectativas de Israel (Isa. 62:1; 65:6, 7; Sal. 50:3-6). É interessante notar que o 4° livro de Esdras, escrito na última parte do século I de nossa era, relata uma crença judaica que menciona que o fim da história trará um "silêncio" correspondendo ao silêncio antes da criação do mundo:
"E o mundo voltará para silêncio primitivo por sete dias, como foi no primeiro princípio; de maneira que ninguém ficará".1
O sétimo selo parece declarar um "silencio no céu" como o fim da "grande voz" dos mártires por justiça divina. Dessa forma, o ciclo profético dos selos ressegura à igreja que Cristo é o Senhor da história e um fiel guardador do pacto. As bênçãos do pacto prometidas à igreja em Apocalipse 2 e 3 serão outorgadas aos que perseveram na fé ou no testemunho de Jesus até o fim! Este tema de cumprimento chega a ser o enfoque principal de consolo na visão de João de Apocalipse 7.
 
Hans K. LaRondelle
Referencia:
1. Charlesworth, The Old Testament Pseudepigrapha, t. 1, p. 537 (4 Esdras 7:30).

domingo, 4 de novembro de 2012

O TEMPO DO FIM - Apocalipse 7


Apocalipse 7 contém um interlúdio ou parêntese no ciclo dos selos. Neste capítulo João tira partido de sua teologia do povo remanescente. Apocalipse 7 mostra um foco específico do tempo do fim que complementa o quinto selo (Apoc. 6:9-11 ). Tanto este selo como Apocalipse 7 tratam do mesmo tema: a grande tribulação para o povo de Cristo. O raio de luz da profecia põe de relevo a tribulação final com sua crise universal. Não só os poderes perseguidores do mundo causam a crise, mas também em um sentido mais elevado, a crise causa a ira do Cordeiro manifestada nas sete últimas pragas (Apoc. 6:16, 17; 15:1). O amparo divino é essencial se a última geração do povo de Deus vai passar incólume durante o derramamento da ira de Deus. Apocalipse 7 está planejado para assegurar a todas as gerações do povo de Deus, especialmente à última, a provisão que tem feito para resgatar a cada seguidor de Cristo nesse tempo de emergência.
Esta crise de proporções mundiais imposta pelo céu se descreve no sexto selo, onde os sinais cósmicos introduzem o dia do juízo. Por conseguinte, a pergunta existencial "e quem poderá ficar de pé?" chega a ser crítica (Apoc. 6:17). Esta pergunta fundamental tinha sido feita antes por três profetas: Joel (2:11), Naum (1:6) e Malaquias (3:2). Cada vez o profeta respondeu sua pergunta dizendo que a única maneira de permanecer em pé no dia da ira é tendo um arrependimento verdadeiro (Joel 2:12-27; Naum. 1:7; Mau. 3:3, 4). Naum recalcou que só Jeová é "fortaleça no dia da angústia; e conhece os que nele confiam" (Naum. 1:7).
Portanto, podemos esperar encontrar a resposta a esta pergunta de Apocalipse 6:17 no capítulo 7. O propósito de Apocalipse 7 é mostrar os que ficarão de pé no dia da retribuição. A pergunta: "Quem poderá ficar de pé?", é totalmente essencial para os que estiverem vivos quando terminar repentinamente o tempo de graça e se derramarem do céu as 7 pragas. Apocalipse 7 é para alentar o povo de Deus a perseverar até o fim em sua fé em Cristo. É um dos capítulos mais tranquilizadores para a fé cristã. Pela primeira vez encontramos aqui a um grupo denominado os "144.000" israelitas verdadeiros. Estes podem permanecer firmes no dia do Senhor sem temor, porque têm um refúgio contra a ira do Cordeiro. Seu lugar especial na história da salvação é no fim do tempo. Sairão triunfantes da grande tribulação. Este é o marco do fim do tempo de Apocalipse 7 em seu contexto imediato do sexto selo.
"Depois disto, vi quatro anjos em pé nos quatro cantos da terra, conservando seguros os quatro ventos da terra, para que nenhum vento soprasse sobre a terra, nem sobre o mar, nem sobre árvore alguma. Vi outro anjo que subia do nascente do sol, tendo o selo do Deus vivo, e clamou em grande voz aos quatro anjos, aqueles aos quais fora dado fazer dano à terra e ao mar, dizendo: Não danifiqueis nem a terra, nem o mar, nem as árvores, até selarmos na fronte os servos do nosso Deus. Então, ouvi o número dos que foram selados, que era cento e quarenta e quatro mil, de todas as tribos dos filhos de Israel" (Apoc. 7:1-4).
Com esta descrição de libertação divina, o Senhor ressuscitado assegura a seus seguidores que as pragas não destruirão toda a humanidade. Primeiro Cristo colocará um sinal de proteção sobre seus "servos". "Conhece o Senhor aos que são seus" (2 Tim. 2:19). Malaquias tinha prometido uma proteção especial para o povo de Deus ao final da história.
"Então, os que temiam ao Senhor falavam uns aos outros; o Senhor atentava e ouvia; havia um memorial escrito diante dele para os que temem ao Senhor e para os que se lembram do seu nome. Eles serão para mim particular tesouro, naquele dia que prepararei, diz o Senhor dos Exércitos; poupá-los-ei como um homem poupa a seu filho que o serve. Então, vereis outra vez a diferença entre o justo e o perverso, entre o que serve a Deus e o que não o serve" (Mau. 3:16-18).
A teologia hebraica expressa de que haverá um povo remanescente final de Deus. Isto implica a separação de um Israel que adora a Deus de um Israel nominal.
Daniel também apontou o remanescente de Israel desta maneira: "Mas, naquele tempo, será salvo o teu povo, todo aquele que for achado inscrito no livro" (Dan. 12:1). Daniel distingue entre um Israel nacional e um Israel espiritual. Só os que estão registrados no céu como cidadãos do reino de Deus, serão sacados da tribulação final no fim dos dias (vs. 1, 2). O anjo assegurou a Daniel: "Muitos serão purificados, embranquecidos e provados; mas os perversos procederão perversamente, e nenhum deles entenderá, mas os sábios entenderão" (v. 10). Isaías também predisse que um remanescente santo sobreviveria ao juízo do Deus de Israel:
"Será que os restantes de Sião e os que ficarem em Jerusalém serão chamados santos; todos os que estão inscritos em Jerusalém, para a vida, quando o Senhor lavar a imundícia das filhas de Sião e limpar Jerusalém da culpa do sangue do meio dela, com o Espírito de justiça e com o Espírito purificador. Criará o Senhor, sobre todo o monte de Sião e sobre todas as suas assembleias, uma nuvem de dia e fumaça e resplendor de fogo chamejante de noite; porque sobre toda a glória se estenderá um dossel e um pavilhão, os quais serão para sombra contra o calor do dia e para refúgio e esconderijo contra a tempestade e a chuva" (Isa. 4:3-6).
Em Apocalipse 7, Deus assegura à sua igreja que sua ira não se derramará até que tenha selado seu verdadeiro Israel. Esse selo os protegerá, não só da morte física, mas também de todos os poderes sobrenaturais de destruição, tanto demoníacos (Apoc. 9:4) como divinos (cap. 16). Só dessa maneira podem permanecer em pé no último dia. Desta maneira Cristo cumpre sua promessa:
"Porque guardaste a palavra da minha perseverança, também eu te guardarei da hora da provação que há de vir sobre o mundo inteiro, para experimentar os que habitam sobre a terra" (Apoc. 3:10).
 
O "selo do Deus vivo", que os anjos do céu porão sobre a "fronte dos servos de nosso Deus" (Apoc. 7:2, 3), está em agudo contraste com a "marca da besta", uma batalha estritamente do tempo do fim contra os santos (ver 13:15-17). Ambos os sinais de identificação operam em forma simultânea no tempo do fim como o cenário final de separação definitiva.
Alguns identificaram este selo apocalíptico com o selo do evangelho do qual Paulo fala no Efésios 1:13; 4:30 e 2 Coríntios 1:21 e 22. Paulo disse que a segurança da salvação do crente estava selada no coração pelo Espírito Santo. Cristo nos "ungiu" e portanto, "também nos selou, e nos deu o penhor do Espírito em nossos corações" (2 Cor. 1:22). Mas este selo do evangelho colocado pelo Espírito no coração não deve identificar-se completamente com o único selo apocalíptico que os anjos colocarão sobre a fronte dos servos de Deus (Apoc. 7:1-3).
O selo do tempo do fim tem um propósito diferente que o de assegurar a salvação pessoal. É um sinal externo acrescentado ao selamento interno do Espírito, como o sinal da aprovação divina durante a

sábado, 3 de novembro de 2012

A Besta e o Anticristo


O livro de Daniel é conhecido como o Apocalipse do Antigo Testamento. Na realidade o Apocalipse é apenas o complemento e a ampliação das profecias de Daniel. Dificilmente, portanto, um poderá ser entendido sem o auxílio do outro. É in dispensável que se atente para a perfeita harmonia entre os dois livros, na referência ao poder anticristão representado por Roma.
Ambos fazem menção ao mesmo poder. Vamos analisar as quatro dimensões mencionadas no texto referido de Daniel 7:25, que caracterizam sem nenhuma dúvida o poder religioso assentado em Roma, comparando-as com suas similares do livro de Apocalipse.
A primeira delas trata das blasfémias: E proferirá palavras contra o Altíssimo... (Daniel 7:25). E foi-lhe dada uma boca para proferir grandes coisas e blasfémias... E abriu a sua boca em blasfémias, contra Deus, para blasfemar do Seu nome, e do Seu Tabernáculo, e dos que habitam no céu (Apocalipse 13:5-6). Então tive vontade de conhecer a verdade sobre o quarto animal que era diferente de todos os outros, muito terrível... e também das dez pontas que tinha na cabeça, e da outra que subia, de diante da qual caíram três... que tinha olhos e uma boca que falava grandiosamente, e cujo parecer era mais firme do que o das suas companheiras (Daniel 7:19-20). O qual se opõe, e se levanta contra tudo que se chama Deus, ou se adora; de sorte que se assentará, como Deus, no templo de Deus, que rendo parecer Deus (II Tessalonicenses 2:4).
Primeiramente é necessário que se conceitue o verdadeiro significado da palavra blasfémia. Note-se o esclarecedor relato bíblico, quando Jesus Se dirigiu a alguém, perdoando os seus pecados: E, vendo Ele a fé deles, disse-lhe: Homem, os teus pecados te são perdoados. E os escribas e os fariseus começaram a arrazoar, dizendo: Quem é este que diz blasfémias? Quem pode perdoar pecados, senão só Deus? (S. Lucas 5:20-21).
Ora, segundo eles Jesus estava blasfemando porque pretendia perdoar pecados. Em outra ocasião, novamente Jesus foi acusado pelos judeus de blasfemar: Os judeus responderam, dizendo-Lhe: Não te apedrejamos por alguma obra boa, mas pela blasfémia, porque, sendo tu homem, te fazes Deus a ti mesmo (S. João 10:33).
Jesus podia e pode só Ele, perdoar pecados, porque Ele é Deus. Os judeus não O aceitavam como tal e por isto o acusavam de blasfémia. E o poder humano estudado que se arroga o direito de perdoar pecados e considerar-se no lugar de Cristo, como Seu substituto?
O dicionário Aurélio, já mencionado, conceitua a palavra blasfémia como palavras que ultrajam a divindade ou a religião.
A seguir registraremos algumas das absurdas e assombrosas afirmações papais, em que o poder anticristão manifesta a sua pretensão blasfema de ocupar o lugar de Deus, na Terra:
Há, no Direito Canónico, uma proposição que afirma, claramente: O papa romano não ocupa o lugar de um mero homem, senão o do verdadeiro Deus neste mundo (Direito Canónico C. 3, x de translat. e Piso 1,7., referi do em Testemunhos Históricos, p. 430).
Sobre a mesma pretensão, outra referência: Em uma passagem que faz parte da lei canónica romana, o papa Inocêncio III declara que o pontífice romano é o representante sobre a Terra, não de um mero

terça-feira, 23 de outubro de 2012

AS TROMBETAS NO SEU CONTEXTO - Apocalipse 8 e 9


O problema fundamental que os intérpretes futuristas têm com o livro do Apocalipse é a sua hipótese de que João descreve os eventos do tempo do fim com uma exatidão fotográfica e com absoluta literalidade. Entretanto, o Apocalipse descreve o que Deus "comunicou" por meio de um anjo a João (Apoc. 1:1). Portanto, tomar com literalidade absoluta as imagens que João apresenta dos eventos futuros é um mal-entendido básico do Apocalipse que conduz a um quadro especulativo do tempo do fim.
 
João apresenta o futuro numa linguagem figurada e simbolismo complexos. Uma chave para entender o estilo literário de João é o seu modelo de antecipação e ampliação. Por exemplo, as promessas de Cristo aos vencedores nos capítulos 2 e 3 voltam como tendo sido cumpridas nos capítulos 21 e 22. O anúncio da queda de Babilónia no capítulo 14 explica- se mais tarde nos capítulos 16 aos 19. A besta perseguidora no capítulo 11:7 se descreve mais completamente nos capítulos 13 e 17. João usa a técnica de entrelaçar as suas visões antecipadoras na primeira metade do livro com a narração orientada ao fim na segunda metade. O Apocalipse é um corpo coerente, um todo orgânico que mostra uma formosa concepção arquitectónica.
 
O maior desafio é como entender as reiterações manifestas que há no livro. Várias vezes se descreve o fim desta era (Apoc. 1:7; 6:12-17; 11:15-19; 14:14-20; 19:11-21; 20:11-15). Estas visões reiterativas do fim são parte do propósito do autor. Excluem a hipótese de que João descreve a era da igreja em uma sequência de linha reta. Antes, apresenta perspectivas diferentes do fim. João descreve os 7 selos (caps. 6 e 7), as 7 trombetas (caps. 8-11) e as 7 pragas (caps. 16 e 17), como ciclos paralelos que se complementam entre si e que cada vez mais se centram sobre os eventos finais.
 
O livro do Apocalipse como um todo avança da promessa ao cumprimento. Este movimento se parece com um movimento para cima de uma escada em espiral. As séries de selos, trombetas e pragas, constrói-se uma sobre a outra. Juntas expressam de uma maneira mais adequada a complexidade da era da igreja que qualquer desses ciclos por si só. Cada ciclo revela sua própria ênfase sobre a apostasia, o juízo e a liberação. Este modelo intensificado reforça a mensagem de esperança para a acossada igreja de Cristo. Também rebate uma aceitação fatalista de todas as hostilidades.
 
A igreja perseguida deve recordar que o Cristo glorificado é descrito como um Cordeiro todo-poderoso com "sete chifres" (Apoc. 5:6). No Antigo Testamento, um "chifre" é o símbolo de poder militar e político (Deut. 33:17; Dan. 7:24). A linguagem figurada pouco realista de um cordeiro com 7 chifres, assegura ao povo de Deus que o Cordeiro de Deus, aparentemente derrotado, agora tem poder omnipotente para julgar e libertar. Tem esta capacidade porque triunfou sobre Satanás no céu e na terra por meio de seu testemunho e de sua morte (Apoc. 5:5, 9). Agora lhes volta a assegurar a seus verdadeiros seguidores que eles também "reinassem sobre a terra" (v. 10).
 
João apresenta a história da apostasia, a perseguição e a libertação, primeiro nos 7 selos e depois nas 7 trombetas (Apoc. 6-9). Como Jesus foi duas vezes através da era da igreja em Mateus 24 (a: vs. 4-14; b: vs. 15-31), assim também observamos como o Cristo ressuscitado repete os temas básicos de Mateus 24 nos selos e nas trombetas. Enquanto os selos informam o leitor a respeito dos sofrimentos da igreja, as trombetas tratam com os juízos preliminares de Deus sobre os inimigos de seu povo fiel.
 
APOCALIPSE - A Visão Preliminar das Trombetas
Em Apocalipse 8:2-6, João apresenta uma visão preliminar em que mostra a origem e o propósito das 7 trombetas. Começa e termina com o anúncio de que há 7 anjos diante de Deus que receberam 7 trombetas (8:2, 6). Este artifício literário, uma inclusão-introdução, marca a visão preliminar como uma unidade independente. Descreve o ministério intercessor de Cristo e sua terminação.
 
Esta cena do trono celestial em Apocalipse 8 funciona em uma forma similar à visão preliminar aos 7 selos em Apocalipse 5. Como os 24 anciões tinham "taças de ouro cheias de incenso, que são as orações dos santos" (5:8), assim João vê em Apocalipse 8 a um anjo que tinha "um incensário de ouro", de pé ante o altar, "e lhe deu muito incenso para acrescentá-lo às orações de todos os santos sobre o altar de ouro que estava diante do trono" (8:3). A petição das orações dos santos martirizados "sob o altar" mencionou-se nos selos em Apocalipse 6:9 e 10. Clamam por vingança divina por causa da injustiça que lhes fez, assim como pelo pacto que Deus tem com eles. Pedem a Deus que seja "fiel" a seu pacto. Dessa maneira, a visão de Apocalipse 8:3 e 4 iguala o período de tempo dos selos em Apocalipse 6. A visão se refere ao contínuo ministério intercessor de Cristo no céu, porque recorda a oferta diária de incenso no serviço do santuário israelita (Êxo. 30:1, 7, 8).
 
O principal tema desta visão preliminar das trombetas é a segurança de que Cristo ouve as orações suplicantes de seu povo oprimido como se declara diretamente em Hebreus 4:14-16. Embora as orações de todos os santos se elevam diretamente a Deus, necessitam o "incenso" essencial do próprio altar de Deus. Este incenso representa a propiciação divina por nossos pecados.
Disse João a respeito de Cristo: "E ele é a propiciação [hilasmos] por nossos pecados" (1 João 2:2; também 4:10). Ellen White oferece esta aplicação prática: "O universo celestial contempla de amanhã e de tarde cada família que ora, e o anjo com o incenso, que representa o sangue da expiação, acha acesso diante de Deus".1 A visão preliminar termina com uma cena que descreve a finalização do ministério do anjo com o incenso seguido pelo fato de enchê-lo com fogo do altar e lançá-lo na terra, acompanhado pelos trovões, os relâmpagos e um terremoto:
 
"E o anjo tomou o incensário, encheu-o do fogo do altar e o atirou à terra. E houve trovões, vozes, relâmpagos e um terremoto" (Apoc. 8:5).
 
Em seu ato final, o anjo usa o incensário não mais para a intercessão e sim para o juízo: fogo sem incenso. Isto indica que as orações dos santos (Apoc. 6:9-11 ) serão respondidas por meio dos juízos sobre a terra, seguidos pela aparição do Juiz de toda a terra em conexão com um terremoto cósmico. Um protótipo surpreendente se encontra em Ezequiel, quem descreve uma visão da maldição de Jeová sobre a Jerusalém impenitente:
 
"E falou [Jeová] ao homem vestido de linho, dizendo: Vai por entre as rodas, até debaixo dos querubins, e enche as mãos de brasas acesas dentre os querubins, e espalha-as sobre a cidade" (Ezeq. 10:2).

 
O contexto histórico assinala que justamente antes do fatídico ano 586 a.C., o Deus de Israel estava abandonando o templo de Jerusalém com um estrondo poderoso (Ezeq. 10:4, 5, 18). O arrojar as brasas acesas simbolizava a execução do juízo de Deus sobre Jerusalém por meio da guerra e do exílio (Ezeq. 11:8-10). Este juízo foi a manifestação da maldição do pacto se eram desobedientes predita em Levítico 26, o que incluía a destruição de Jerusalém, de seu templo e a dispersão de Israel por meio das guerras (Lev. 26:31-34). A maldição do pacto implicava que Deus faria guerra contra seu povo apóstata: "Eu também procederei contra vós, e vos ferirei ainda sete vezes por seus pecados" (26:24). Não obstante, o Deus do pacto proporcionaria misericórdia para os que se arrependessem e confessassem seus pecados (vs. 40-45; Ezeq. 11:16-21).
 
No marco histórico de Ezequiel, o pulverizar as brasas acesas do trono de Deus sobre a terra não simbolizava o juízo final mas ser um juízo punitivo sobre Israel, com o propósito de levá-los a arrependimento (ver Ezeq. 11:18-20). A visão preliminar de João às 7 trombetas em Apocalipse 8:2-6 deve entender-se contra este transfundo de Ezequiel. A visão de João inclui tanto o tempo de graça como a ira de Deus.

 
A série das trombetas não anuncia meramente a ira final de Deus (esta chega só sob a sétima trombeta), mas também a sequência de juízos restringidos, os quais "só" danificarão um terço da terra (11 vezes em Apoc. 8 e 9). Estes juízos parciais das 6 primeiras trombetas são juízos de admoestação preliminares. Admoestam ao mundo quanto às últimas pragas que virão e a ira de Deus sem mistura de misericórdia à conclusão do Dia da Expiação, quando ninguém pode entrar no templo do céu (Apoc. 15:1, 5-8).
As 6 primeiras trombetas ainda saem do altar de ouro de incenso que estão diante de Deus (Apoc. 9:13). Isto sugere que o tempo de graça ainda não terminou durante essas 6 trombetas. O ato simbólico de arrojar fogo do altar sobre a terra indica a iniciação dos juízos de Deus em resposta às orações de súplica dos santos. A sequência das 6 trombetas (caps. 8 e 9) que culminam na sétima trombeta ou as 7 últimas pragas (caps. 15 e 16), ensinam que os atos simbólicos do anjo diante do altar terão um duplo cumprimento:
 
1. Calamidades de extensão limitada durante a era da igreja;
2. As últimas pragas, sem misericórdia, sobre os inimigos universais de Cristo e de seu povo.

A Relação Entre os Selos e as Trombetas
 
Uma pergunta provocadora é esta: Quando começam as trombetas em relação com os selos que as precedem? São totalmente paralelos estas séries e portanto simultâneas, ou consecutivas, ou só parcialmente paralelas? Não há uma opinião unânime entre os eruditos bíblicos sobre este ponto. O Comentário bíblico adventista informa que a interpretação que favorece os adventistas vê que as "trombetas correspondem cronologicamente, em grande medida, com o período de história cristã que abrangem as sete igrejas (caps. 2 e 3) e os sete selos (6; 8:1), os quais destacam os acontecimentos políticos e militares sobressalentes deste período".2
 
Também se menciona o ponto de vista "sequencial" de acordo com o qual os 7 juízos das trombetas se derramam sobre a terra depois da terminação do tempo de graça. Mas este ponto de vista não encontra respaldo no contexto bíblico por parte da "Comissão Adventista sobre Daniel e Apocalipse". Assinala que os eventos da proclamação do evangelho do tempo do fim em Apocalipse 10 e 11:1-14 pertencem à sexta trombeta. Portanto, tira-se a seguinte conclusão: "Os acontecimentos das trombetas ocorrem no tempo de graça, no tempo histórico... Se a sétima trombeta está unida à terminação da obra do evangelho, a dispensa evangélica, então as 6 trombetas precedentes devem necessariamente soar durante o tempo de graça".3
 
A opinião que mantém que as trombetas soam depois do tempo de graça se apoia sobre a hipótese de que as trombetas começam só depois da finalização da visão preliminar de Apocalipse 8:2-6. Este ponto de vista supõe que a cena do santuário e as trombetas em Apocalipse 8 estão descritas em uma sequência cronológica. Mas esta hipótese não está justificada em vista do fato de que as outras visões preliminares do santuário não expiraram antes que comece cada série: a que precede as 7 igrejas (Apoc. 1), a que precede os 7 selos (Apoc. 5), e a que precede as 7 pragas (Apoc. 15). Todas as visões preliminares seguem ativas durante cada série. De fato, cada carta às 7 igrejas se refere a Cristo como aparece na visão inaugural de Apocalipse 1; cada abertura dos selos é o resultado da obra de Cristo na visão de introdução de Apocalipse 5; cada uma das 7 pragas são derramadas enquanto ninguém pode entrar no templo (Apoc. 15:8).
 
Por conseguinte, é uma hipótese mais adequada ver a visão do trono de Apocalipse 8:2-6 como a fonte ativa permanente das 7 trombetas. Jon Paulien conclui dizendo: "É mais provável que João tinha a intenção de que o leitor visse a intercessão ante o altar de ouro como estando disponível até o instante quando soasse a sétima trombeta, que leva à consumação do 'mistério de Deus' (Apoc. 10:7), quer dizer, a terminação do evangelho (Rom. 16:25-27; Ef. 3:2-7; 6:19)".4
 
O fato de que a quinta trombeta se refira ao "selo de Deus" sobre as frontes do povo de Deus (Apoc. 9:4), e que por isso parece coincidir com o selamento do tempo do fim dos servos de Deus em Apocalipse 7, é uma característica significativa. A referência ao selo de Deus sobre "a fronte" indica que a obra do selamento de Apocalipse 7 e a quinta trombeta estão intimamente conectadas. Ambos os eventos podem ser vistos como contrapartes históricas que acontecem até durante o tempo de graça. Também se reconheceu que a sexta trombeta tem um forte paralelo com o selamento de Apocalipse 7 porque esta trombeta descreve graficamente os equivalentes demoníacos dos 144.000 em uma quantidade assombrosa de tropas (Apoc. 9:13-18).5
 
É importante observar que a ordem de Deus para o tempo do selamento, "não danifiqueis nem a terra, nem o mar, nem as árvores, até selarmos na fronte os servos do nosso Deus" (Apoc. 7:3), ainda segue em efeito durante a quinta trombeta (9:4), apesar de que as trombetas anteriores causaram um dano parcial à terra, ao mar e às árvores ("uma terça" parte foi afetada, 8:7-9).
A revelação de que o juízo da sexta trombeta vem de parte do anjo que está entre os "quatro ângulos do altar de ouro que se encontra na presença de Deus" (Apoc. 9:13), indica que as 6 primeiras trombetas abrangem todo o tempo de graça da era da igreja. O que cada trombeta descreve com referência à história humana real, deve determinar-se por uma aplicação cuidadosa de cada trombeta à história política e religiosa da igreja cristã do Império Romano até nossos dias. As trombetas não devem ser consideradas por si mesmas, isoladas do amplo contexto do Apocalipse se queremos evitar conclusões especulativos.
 Referencias:
1. Ellen White, 7 CBA 982 (T. 7-A, P. 412).
2. 7 CBA 804.
3. Holbrook, Symposium on Revelation – Book 1, p. 181.
4. Paulien, "Seals and Trumpets: Some Current Discussions", Simpósio sobre o Apocalipse, T. 1, p. 195.
5. Ver Paulien, Ibid., p. 196.

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

As Últimas Pragas Caem Depois do Tempo de Graça


O conteúdo da sétima trombeta se revela nas 7 pragas do juízo final de Deus (Apoc. 15, 16). Isto dá a entender ao contar explicitamente as 3 últimas trombetas como três "ais" sobre os moradores da terra (8:13).
A quinta e a sexta trombeta se caracterizam como o primeiro e segundo "ai" (Apoc. 9:12; 11:14), como o anúncio de que o "terceiro ai vem logo" (11:14). Entretanto, a sétima trombeta não inclui nenhum ai, excepto a declaração de que chegou "o tempo de julgar aos mortos, e de dar o galardão a seus servos... e de destruir os que destroem a terra" (11:18). Portanto, alguns intérpretes deduziram que a sétima trombeta não está de todo incluída no terceiro ai. Mas outros assinalam corretamente à revelação posterior de João de que as 7 pragas serão o "último ai", porque nelas "está consumada a ira de Deus" (15:1). Isbon T. Beckwith comenta a respeito: "A admissão das taças com as pragas como o terceiro ai tem uma relação importante sobre a questão da composição do Apocalipse".6 A série das trombetas está inextricavelmente entretecida com as 7 últimas pragas por meio do desenho dos três ais de João. De modo que, a porção maior do Apocalipse, os capítulos 8 a 19 constituem uma unidade que desdobra uma ordem sucessiva dos juízos de Deus.
O ponto crítico nesta sequência cronológica é o começo das 7 últimas pragas, descritas como que nelas "está consumada a ira de Deus" (Apoc. 15:1; 14:10). O termo "puro" [akrátou, sem diluir] indica que a ira de Deus se manifestará em "sua força total" nas 7 últimas pragas (14:10, NBE).
Isto significa que a justiça já não está unida com a graça em "o cálice de sua ira". João recalca a advertência de que o que rechace a mensagem final de Deus será "atormentado com fogo e enxofre, diante dos santos anjos e do Cordeiro" (Apoc. 14:10). Isto nos recorda o juízo de Deus sobre Sodoma e Gomorra (ver Gén. 19:24, 25), e confirma o conceito de que as pragas chegam depois que terminou o tempo de graça. A declaração, "e a fumaça de seu tormento sobe pelos séculos dos séculos" (Apoc. 14:11), recorda-nos a destruição divina de Edom como uma "retribuição no pleito de Sião" (Isa. 34:8-10). Alude-se em forma patente a estes juízos do Antigo Testamento como tipos do derramamento final da ira de Deus nas 7 últimas pragas.
Uma indicação específica do momento decisivo da história da salvação com as últimas pragas é a revelação de que ninguém pode entrar no templo celestial durante esse tempo:
"A fumaça da glória de Deus e de sua potência encheu o santuário; ninguém podia entrar nele até que não se terminassem as sete pragas dos sete anjos" (Apoc. 15:8, NBE).
 
Este texto ensina que quando tiver chegado o tempo de Deus, as pragas não podem ser demoradas mais pelas orações de intercessão. A "fumaça da glória de Deus" recorda-nos a nuvem da shekinah que se manifestava no templo do Israel como a presença visível de Deus (ver 2 Crón. 5:13, 14; 7:1, 2; Ezeq. 10:2-4). Quando Isaías viu o Senhor sentado sobre um trono enquanto o templo "encheu-se de fumaça" (Isa. 6:1, 4), recebeu mensagens de condenação para o Israel apóstata (vs. 9-13). De modo parecido, João vê a fumaça vindo das taças de ouro "cheias da ira de Deus" (Apoc. 15:7). O significado é evidente: "O tempo para a intercessão terminou. Deus, em sua majestade e poder inacessíveis, declarou que o fim chegou. Já não permanece chamando: entra para atuar em juízo soberano".1
Se as 7 últimas pragas constituírem os ais da sétima trombeta, isto dá a entender que as 6 trombetas prévias simbolizam os juízos preliminares de Deus que têm lugar durante a época da igreja. Se os juízos das pragas assinalam o começo do tempo em que já não há graça, então os juízos das trombetas caem dentro do tempo de graça e abrangem a época da igreja. Este entrelaçamento das trombetas e as pragas apresenta um panorama telescópico que João condensou em sua visão preliminar do trono de Apocalipse 8:2-5.
Comparação das Visões Preliminares das Trombetas e das Pragas
É significativo que a série das trombetas e das pragas estão arraigadas em uma visão específica do santuário: Apocalipse 8:2-5 e 15:1, 5-8. Tanto suas distinções como suas características comuns estão cheias de significado. A visão que João teve do altar em Apocalipse 8 revela dois cenários sucessivos, um de oração intercessora com incenso ante o altar (Apoc. 8:3, 4), seguida por uma em que se arroja fogo à terra por meio do incensário (v. 5). Deste modo, esta visão une o serviço mediador de Cristo no altar do incenso com sua obra final de juízo por fogo. A visão termina com uma descrição da vinda de Deus à terra: "E houve trovões, e vozes, e relâmpagos, e um terremoto" (v. 5). Jon Paulien sintetiza ambos os cenários: "As [advertências das trombetas] simbolizam os juízos atuais de Deus que constituem uma advertência de juízos maiores que têm que vir".8 As trombetas e as pragas se relacionam entre si como tipos históricos locais ao antítipo mundial.
A sétima trombeta termina com uma visão do templo que mostra uma assinalada progressão com a de Apocalipse 8. João vê o templo de Deus no céu outra vez aberto, mas agora contempla "o arca de seu pacto" seguida por "trovões, relâmpagos, um terremoto e grande granizo" (Apoc. 11:19). A sequência é evidente. O foco de atenção mudou do altar celestial de incenso em Apocalipse 8 até o arca do pacto de Deus, que no templo de Israel estava colocada no lugar santíssimo.
Esta seqüência progressiva aponta ao Dia da Expiação nos serviços do tabernáculo do Israel (ver Lev. 16). No último dia, Deus separava o arrependido do impenitente: "Porque toda pessoa que não se afligir neste mesmo dia, será eliminada de seu povo" (Lev. 23:29).
A visão do templo onde aparece a arca em Apocalipse 11:19 se amplia adicionalmente em Apocalipse 15:5-8, onde se descreve o ministério de juízo dos 7 anjos. Quando esses anjos derramaram suas taças da ira de Deus sobre a terra, a voz de Deus exclama desde seu trono: "Feito está. Então houve relâmpagos e vozes e trovões, e um grande tremor de terra... E caiu do céu sobre os homens um enorme granizo" (Apoc. 16:17, 18, 21). Esta descrição final se compara com a de Apocalipse 11:19, dando à sétima trombeta a mesma terminação como a que tem a sétima praga. Dessa maneira as trombetas continuam nas últimas pragas. E tanto as trombetas como as pragas estão implantadas na visão do trono de Apocalipse 8:2-5. Jon Paulien o declara bem em sua recapitulação:
"O livro do Apocalipse flui em forma natural... de um panorama da cruz a um panorama da inauguração do ministério de Cristo à luz da cruz (Apoc. 5), até um quadro do ministério intercessor que resulta disso (Apoc. 8:3, 4), e em última instância ao juízo que antecede o fim (Apoc. 11:18, 19). Esta ordem de eventos é característica de todo o Novo Testamento".2
As descrições da teofania final em Apocalipse 11:19 e 16:17-21 mostram o característico adicional de uma enorme tormenta de granizo não incluída em Apocalipse 8:5. O significado deste acréscimo pode ver-se no fato de que o "granizo" era uma parte essencial das guerras santas de Deus contra seus inimigos (Jó 38:22, 23): contra Egito (Êxo. 9:18, 22-26), contra os amorreus (Jos. 10:11), contra os inimigos do Davi (Sal. 18:12-14), contra um Israel apóstata e rebelde (Isa. 28:2, 17) e contra Judá (Ezeq. 13:11, 13).
Especialmente, a predição de Ezequiel de que Deus lutará contra Gogue e suas nações aliadas, por sua ardente ira com "um grande tremor sobre a terra" junto com "impetuosa chuva, e pedras de granizo, fogo e enxofre" (Ezeq. 38:19, 22), é significativo. O cumprimento da última guerra santa que Ezequiel apresenta, e que o Apocalipse explica como "Armagedom" (Apoc. 16:13-16), não terá lugar durante as 6 primeiras trombetas, e sim durante as últimas pragas. Richard Bauckham interpretou a ampliação gradual do terremoto escatológico e do granizo em Apocalipse 8:5, 11:19, 15:5 e 16:17-21 da seguinte maneira:
"O desenvolvimento progressivo da fórmula harmoniza com a severidade cada vez major de cada série de juízos, quando as visões se enfocam mais estreitamente sobre o próprio Fim e as advertências limitadas dos juízos das trombetas dão lugar às sete últimas pragas da ira de Deus sobre os que finalmente são impenitentes".3
Os juízos das trombetas revelam algo da paciência angustiosa de Deus com seus inimigos. O aumento gradual da intensidade dos juízos de Deus mostra a reticência divina para pôr fim ao tempo de graça. Aqui se aplicam as palavras do Pedro: "O Senhor não retarda sua promessa, segundo alguns a têm por tardança, mas sim é paciente para connosco, não querendo que nenhum pereça, mas que todos procedam ao arrependimento" (2 Ped. 3:9).
Referencias:
1. Mounce, The Book of Revelation, p. 290.
2. Paulien, Decoding Revelation's Trumpets. Literary Allusions and Interpretation of Revelation 8:7-12, p. 208.
3 Paulien, "Seals and Trumpets: Some Current Discussions", Simpósio sobre o Apocalipse, t. 1, p. 197.