Vejamos o texto bíblico que serve de base a tal interpretação: “Setenta semanas foram fixadas ao teu povo e à tua cidade santa (…). Após estas sessenta e duas semanas um Ungido será exterminado e ninguém lhe sucederá. (…). E sobre o pináculo do templo estará a abominação da (…)” – Daniel 9:26, 27
(os leitores devem ter em conta que se trata de uma contestação a uma tese defendida pelo padre Carreira das Neves, segundo a nossa opinião não tem sustenção). O autor refere que as ”setenta semanas de anos” deverão ser tidas em conta a partir do decreto do rei Ciro da Pérsia em 538 a.C. e não do de Artaxerxes, 457 a.C. . A intenção é obvia, ou seja - para que a profecia coincida com o tempo dos Macabeus!
(os leitores devem ter em conta que se trata de uma contestação a uma tese defendida pelo padre Carreira das Neves, segundo a nossa opinião não tem sustenção). O autor refere que as ”setenta semanas de anos” deverão ser tidas em conta a partir do decreto do rei Ciro da Pérsia em 538 a.C. e não do de Artaxerxes, 457 a.C. . A intenção é obvia, ou seja - para que a profecia coincida com o tempo dos Macabeus!
Depois, declara que o teor do v. 26: “Após estas sessenta e duas semanas um Ungido será exterminado (…)” se refere ao “sumo sacerdote Onias III – cf. II Macabeus 4:30-38, deposto em 175 a. C. e mandado assassinar por Antíoco IV Epifânio em 171 a.C. .
Consideremos alguns pormenores para vermos se tudo é assim tão simples e linear como o autor nos quer fazer crer:
• Ano 175 a. C. – Deposição de Onias III
Não esqueçamos que a profecia revela que o “Ungido” seria exterminado “após estas sessenta e duas semanas”! Antes de continuarmos, convém esclarecer que não se tratam de sessenta e duas semanas literais, mas proféticas! As Escrituras nos autorizam a fazer a equivalência profética, isto é, tomarmos - cada dia por um ano. Vejamos os textos bíblicos que o autorizam:
“Segundo o número de dias que levastes a explorar o país, quarenta; tantos serão os anos em que haveis de expiar as vossas iniquidades: ano por dia (…)” – Números 14:33,34.
“(…) E carregarás o pecado da casa de Judá durante 40 dias; estabeleço um dia para cada ano” – Ezequiel 4:6.
Portanto, só à luz deste pequeno esclarecimento bíblico, a expressão do profeta: “setenta semanas de anos” têm razão de ser. O mesmo se aplicará à restante parte do texto: “sessenta e duas semanas”, visto ser parte integrante do mesmo bloco de semanas proféticas. Assim sendo, cremos estar em condições de avançar para a etapa seguinte.
Estas “sessenta e duas semanas” equivalem a um tempo longo de anos, isto é, (62 semanas x 7 dias da semana = 434 dias/anos). Portanto, temos aqui 434 anos equivalentes às 62 semanas proféticas (de anos). Ora, como o autor revela que estas começaram no ano 538 a. C., assim teremos:
• De acordo com a profecia, o “Ungido” deverá ser exterminado no final destas sessenta e duas semanas. Aplicando o mesmo princípio da “semana de anos”, e se os deduzirmos ao ano de partida – 538 a. C. – como o autor deseja, então chegaremos ao ano 104 a. C. (508-434 = 104 a. C.)! Portanto, este ano deveria, para que a História condiga com a profecia, corresponder ao ano 175 a. C., (deposição de Onias III).
Como vimos, segundo a data apontada pelo autor, chegámos ao ano 104 a. C., data diferente, obviamente de 175 a. C.! Então, o que é que está a acontecer? 1- Ou a profecia bíblica está errada, o que é impensável!; 2- Ou a data para o início da contagem, como deseja o nosso autor, está errada – o que poderá muito bem acontecer! 3- Ou Onias III foi deposto mais cedo do que o previsto profeticamente, isto é, 71 anos antes (104 + 71 = 175) – o que é impensável! 4- Ou então, Onias III, nada tem que ver com esta profecia – e então tudo se explica!
• Se partirmos, desta vez, do ano da deposição de Onias III - 175 a. C. - até ao do inicio da contagem - 538 a. C. – ano proposto pelo nosso autor, então encontraremos o tempo intermédio inerente às sessenta e duas semanas, que é 363 anos (538-175 = 363)!
• Portanto, sob duas formas diferentes para encontrarmos a duração das famosas “sessenta e duas semanas (de anos)”, encontrámos dois valores para a mesma duração: 363 e 434 anos! Perguntamos: Qual deles é o verdadeiro? Ou será que não é nenhum?
• Ou será que outra coisa poderá estar mais certa e em consonância com a realidade profética e, obviamente, histórica, isto é: 1- Ou a data de partida está errada – o que é altamente provável!; 2- Ou o “Ungido” da profecia nada tem a ver com Onias III – o que poderá muito bem acontecer!
• Só mais uma nota curiosa: o autor refere que o texto da profecia “não se refere a Jesus Cristo, ao seu sacrifício, nem as setenta semanas têm a ver com os 490 dias proféticos, pois fazer equivaler um dia a um ano solar literal é pura especulação (…)”. Ora se assim é, perguntamos: então como é que o autor sabe que as setenta semanas da profecia de Daniel são, tal como diz (e muito bem), “setenta semanas de anos”?
Se forem só “semanas”, qual a razão da inserção da palavra “anos”? E mais, se são só ”semanas” - como quer o nosso autor que a todo o custo seja - então como fazer coincidir sessenta e duas semanas (literais) com o ano 175 a. C.? Como é que o autor as esticará? Até porque sessenta e duas semanas dá pouco mais de UM ANO! Como é que o autor resolve isto?
• Versículo 26: ”Um Ungido será exterminado (…). A cidade e o santuário serão destruídos por um chefe invasor (…) ”. Se dermos nomes à intenção profética, como o autor o deseja, então Onias III é o “Ungido exterminado”; de, igual modo, segundo o mesmo autor, Antíoco IV Epifânio encarna “o chefe invasor”! Vejamos mais de perto esta interpretação:
Mesmo assim, nada condiz com nada! Repare-se que o “chefe invasor” - Antíoco IV Epifânio - exterminaria o “Ungido” - Onias III. A ser verdade tal interpretação profética e perante este facto histórico, este dito “chefe invasor” deveria estar contente, porque não só cumpriu a suposta profecia que lhe é inerente, como também anulou mais um opositor, não é verdade? Só que, quando lemos o relato dos acontecimentos, nos Livros Apócrifos, estes dizem-nos que: “(…) Antíoco ficou profundamente abatido e tocado de compaixão, chorou, recordando a sabedoria e a grande moderação de Onias” – II Macabeus 4:33-37. Não é estranha esta atitude do vencedor, quando ele mesmo o manda matar? Ou será um outro Onias? Convenhamos que esta dita “profecia” está muito, mas mesmo muito mal explicada!
• Versículo 27: “(…) E sobre o pináculo do Templo estará a abominação da desolação”. O autor diz que esta parte da profecia, a “abominação da desolação refere-se com toda a certeza à estátua do Zeus Olimpo que Antíoco mandou colocar no Templo de Jerusalém (cf. II Macabeus 6:2) . Para outros autores, este texto aponta, visto estar ligado ao Templo, para a “aparição de uma pessoa, o pseudo-Cristo”.
Antes de prosseguirmos, repare-se na forma como o autor associa o texto profético e a pseudo-realidade que lhe dá forma, ao utilizar a expressão “(…) refere-se com toda a certeza à estátua do Zeus Olimpo” . (sublinhado nosso). Um historiador ou teólogo da craveira e estatura do autor - não pode e não deve - fundamentar os seus pontos de vista em meras suposições! A um académico não fica nada bem tais postulados pois, onde estão os fundamentos para tais afirmações?!
Mas, como dizíamos… a ser verdade a afirmação do autor, cremos não ser demais compará-la com uma de Jesus Cristo! O Filho de Deus, a certa altura do Seu ministério, em certo contexto irá citar este versículo da profecia de Daniel.
Assim, no Seu grande discurso escatológico, Jesus dá a interpretação desta passagem de Daniel. Notemos em que termos o Mestre, ao responder a uma pergunta sobre a magnificência e esplendor do Templo de Jerusalém, se exprime sobre o assunto:
• “(…) Nada ficará delas pedra sobre pedra; tudo será destruído. (…). Quando virdes a abominação da desolação instalada onde não deve estar (…), então os que estiverem na Judeia fujam para os montes (…).” – S. Marcos 13:2, 14-19.
• “(…), aproximaram-se d’Ele os seus discípulos para lhe mostrarem as construções do templo Mas Ele disse-lhes: “Vedes tudo isto? Em verdade vos digo que não ficará aqui pedra sobre pedra; tudo será destruído”. (…) Quando virdes, pois, a abominação da desolação de que falou o profeta Daniel, instalada no lugar santo, (…), então, os que se encontram na Judeia fujam para os montes (…). – S. Mateus 24:1,2,15,16
• “Como alguns falassem do Templo, dizendo que estava guarnecido de belas pedras e adornado de ofertas votivas, respondeu: “Dias hão-de vir em que, de tudo isto que estais a contemplar, não ficará pedra sobre pedra. Tudo será destruído”. (…) Mas quando virdes Jerusalém sitiada por exércitos, ficai sabendo que a sua desolação está próxima”. – S. Lucas 21:5,6,20.
Jesus não disse que os acontecimentos dos quais falava seriam uma espécie de cumprimento posterior e suplementar da profecia de Daniel, segundo deseja o nosso autor, já realizada em 175 a. C. ! Mas que estes, ainda no futuro, seriam aqueles mesmos que o profeta tinha anunciado no passado. Jesus nunca associou esta passagem do profeta a Antíoco IV Epifânio, mas via nela uma profecia que dizia respeito a acontecimentos para lá do Seu tempo, isto é, a destruição do Templo no ano 70 d.C. .
Perguntamos: Que “desolação” será esta? Não será a que foi anunciada previamente pelo profeta Daniel?
A profecia do profeta Daniel, quando refere “a abominação da desolação” – versículo 27, nada tem que ver com a “estátua do Zeus Olimpo” como refere o autor, como veremos mais abaixo com toda a clareza, mas sim com um poder militar que fará aquilo que profeticamente lhe está destinado, segundo a confirmação do próprio Jesus – até porque, desde o tal ano de 175 a.C. (Antíoco Epifânio) – ao tempo de Jesus, prezado leitor, passados quase 200 anos, onde estava esta estátua? Em lado nenhum! Quanto mais, cerca de 40 anos depois, quando o Templo foi destruído – ano 70 d. C.! Sendo assim, prezado leitor, com qual explicação desejará ficar? Com a do referido autor, apesar de todo o respeito que nos merece, ou com a do próprio Filho de Deus? Pensamos que a escolha não será muito difícil!
Bibliografia:
Joaquim Carreira das Neves, OFM, op. cit., pp. 117 e 120.
Joaquim Carreira das Neves, OFM, op. cit., pp. 117 e 120.
Louis Pirot (direcção de), La Sainte Bible, Paris, Ed. Letrouzey et Ané, 1946, vol. VII, p. 691.
J. Jeremias, Theologie du Nouveau Testament, Paris, Ed. Cerf, 1980, p. 164
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