segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

O DRAGÃO E A SERPENTE

O autor (padre Carreira das Neves), neste preciso contexto, aborda a problemática do capítulo 12 do livro do Apocalipse. De seguida, apresenta a sua tradução do versículo 17 que é a seguinte: “Furioso contra a Mulher, o Dragão foi fazer guerra ao resto dos seus filhos, os quais guardam os mandamentos de Deus e se mantêm fiéis a Jesus” .
Na interpretação que faz em relação à Mulher, nada temos a dizer! Parece-nos coerente, em função do contexto imediato, que esta Mulher esteja, obviamente, em oposição à sua parte contrária que, na linguagem apocalíptica, é apresentada como sendo o grande Dragão, a antiga Serpente – cf. v. 9.
No entanto, se nos é permitido realçar a incorrecção, expressa pelo autor, quando comenta este Poder que faz guerra à Mulher (Igreja) e à sua descendência (crentes). Não sabemos se o autor o fez deliberadamente ou se, por mero lapso! Convenhamos que não foi nada feliz na sua interpretação, quando refere, num tom muito seguro, que este Dragão e Serpente “só pode ser o Império Romano”. É isto que não conseguimos entender! Porquê? Por duas ordens de razão, vejamos:

a) O Intérprete – O homem
O autor critica o biblista E. Ferreira, personagem que está na base das considerações sobre a confissão religiosa chamada – Adventistas –, por este aplicar os 1260 dias, descritos em Apocalipse 11:3, como representando a “hegemonia político-religiosa papal (…)”.
Apesar da sua autoridade, que muito respeitamos, a dado passo diz: "Diante deste contexto só não vê quem não quer. Os Adventistas que me perdoem, mas a sua interpretação não tem qualquer fundamento bíblico.” Muito bem! Mas, agora, se tal nos for permitido, perguntamos: qual é o fundamento do autor para escrever o que escreveu, isto é, que o grande Dragão, a antiga Serpente, representa o Império Romano? Não receará o autor que o feitiço se vire contra o feiticeiro?
Tanto quanto saibamos, a Bíblia não é um livro assim tão enigmático para que nos ponhamos a adivinhar e a tentar, ao acaso, conciliar as nossas ideias com os textos bíblicos! No entanto, a crítica que endereça ao biblista acima mencionado, é a mesma que recai sobre si mesmo, por que procede exactamente da mesma maneira, isto é, acusando ligeira e gratuitamente, sem qualquer fundamento escriturístico!
Mas o que diz o próprio capítulo 12 do Apocalipse sobre o assunto? Será que é necessário adivinharmos quem é o quê? Francamente, pensamos que não! Senão vejamos: façamos somente uma simples leitura… não é preciso ser teólogo para a fazer, basta saber ler, nada mais! Vejamos: “O grande Dragão foi precipitado, a antiga Serpente, o Diabo, ou Satanás, que engana o mundo inteiro (…)” – v. 9.
A definição estava lá, só bastava ter um pouco de boa vontade e caridade cristã para ler e transcrever, nada mais!
Este princípio é aquele que é usado pela própria bíblia. Citaremos ainda dois exemplos dentro do mesmo livro! A este respeito a Bíblia diz: 1- “(…) Vem, mostrar-te-ei a condenação da grande prostituta que está sentada junto de muitas águas” – Apocalipse 17:1; 2- “A mulher sentada numa besta de cor escarlate, coberta de nomes blasfematórios, com sete cabeças e dez chifres” – v. 3.
Para que o leitor não especule, como faz o nosso autor, o próprio capítulo tem a chave dos símbolos apresentados. Assim, para a 1ª afirmação: - O enigma das “águas” - é dito que: “(…) são povos, multidões, nações e línguas” – v. 15. Para a 2ª - O das “sete cabeças” - a resposta é “(…) sete colinas (…)” – v. 9.
Portanto, tudo está ali e, quiçá, sem qualquer necessidade do Magistério da Igreja para nos ajudar na compreensão das Sagradas Escrituras! Ou será que estamos enganados ou a exagerar? Quanto a nós, pensamos que não, e o prezado leitor?

b) O Intérprete – A Palavra
A ciência humana, assim como o nosso autor declaram que o livro do Génesis, no que respeita aos relatos acerca das figuras: Criação, Jardim do Éden, Adão, Eva, Serpente, tudo não passa de símbolos metafóricos, ou de “mitos, sagas (…). Mas será assim? Quem terá razão: a dita chamada “ciência”, o nosso autor ou a Palavra de Deus? Vejamos:
Se estes elementos pertencentes ao cenário da Criação não são “verdades”, então como compreender as Escrituras? Jesus, para consolidar o Seu ensino, a eles recorreu, tal como o fizeram os Seus continuadores! Para ensinar uma Verdade, ir-se-á usar o mito que, curiosamente, se encontra no Livro que é conhecido como sendo a Verdade? Estranho Deus; estranho Livro; estranha Verdade!

 Adão
Se esta figura não passa de uma invenção ou de um simbolismo, então a quem se referiam: o profeta Oseias, S. Lucas e S. Paulo? Este será comparado com que figura irreal? Qual a lógica em fundar um ensino sobre suposições? Quem é, logo, este Adão a que se referem os textos? Figura mítica ou realidade?

1- “Mas eles, como Adão, violaram a aliança (…)” - Oseias 6:7 (sublinhado nosso). (Se um ser é mítico, logo, o que ele viola, também o é)!

2- “(…) Jesus tinha cerca de trinta anos, sendo filho, como se supunha, de José (…), e Enos de Set, e Set de Adão, e Adão de Deus” - S. Lucas 3:23,38. (Se Adão é mitológico, então que dizer de Deus, seu criador)?

3- “Contudo, a morte reinou desde Adão até Moisés (…), à semelhança de Adão, que é figura d’Aquele que havia de vir” - Romanos 5:14 (sublinhado nosso). (Jesus, segundo S. Paulo, é a figura de uma personagem mítica)!

4- “Por isso, está escrito: o primeiro homem, Adão, foi feito alma vivente: o último Adão (Cristo) é um espírito vivificante” – I Coríntios 15:45 (sublinhado nosso). (Como se poderá comparar a realidade com o irreal, mitológico)?

Porventura se recorrerá ao mito para ensinar e consolidar uma verdade? Terá sido este o método deixado pelos profetas do passado e, posteriormente pelos Seus seguidores? Continuamos a pensar pela negativa!

 Jardim do Éden, Eva, Serpente
Se estes elementos não passam de símbolos metafóricos, então, como compreender certos ensinamentos das Escrituras neles baseados?
Como já vimos em relação ao texto do Apocalipse 12:9, parece-nos, tal como pudemos mostrar, lendo simplesmente o capítulo 12 do Apocalipse, que o “Dragão” era uma personagem biblicamente conhecida, isto é, “(…) a antiga Serpente, o Diabo, ou Satanás, que engana o mundo inteiro (…)”.
Jesus quando repreendia os fariseus pela sua hipocrisia, a certa altura disse: “Vós sois filhos do Diabo (…). Ele foi assassino desde o princípio e não se manteve na verdade. Quando profere a mentira, fala do que lhe é próprio, porque também é mentiroso e pai da mentira” – S. João 8:44.
Aqui Jesus revela duas particularidades desta personagem, a saber: 1- “assassino desde o princípio”; 2- “mentiroso e pai da mentira”. Perante estas palavras que desmascaram esta personagem, somos forçados a perguntar:

1- Quem é que esta personagem matou, visto ser acusado de “assassino”?!
2- Que mentira é que disse?
3- A quem mentiu?

Como é que uma personagem mítica, dizem, pode comportar tantos atributos e ainda por cima revelados por Jesus, Aquele que disse ser “(…) a verdade (…)” – S. João 14:6? Assim, como responder a estas três perguntas se estamos, uma vez mais, ao nível do mito? Convenhamos que nos é tremendamente difícil! Como passar do abstracto ao concreto? Desde já confessamos as nossas limitações!
Para começar, seria bom que reconhecêssemos o propósito de Deus. Depois, ao falar da Criação e com a agravante de não termos sido testemunhas oculares dos factos, Deus nos quer “ensinar, a partir do relato bíblico e não tanto de nos informar a partir da realidade”! Deus deseja ensinar-nos que Ele é o único criador, não outro; depois, não deseja informar-nos a partir da realidade dos factos, graças a Deus! Sabe porquê? Já pensou se Deus descesse ao encontro da nossa curiosidade? Para que serviria tanto detalhe? Depois, será que o compreenderíamos? Abramos um pequeno parêntesis: Vamos exemplificar um pouco o que queremos dizer só com algumas curiosidades acerca do homem:

- Coração – Sabia que por dia o coração bate cerca de 103. 689 vezes e que bombeia 10.000 litros de sangue? Sabia que o sangue, neste período de tempo, percorre cerca de 286.000 km?

- Cérebro – Sabia que este utiliza, cada dia, cerca de 7.000.000 de células?

- Olho – Sabia que este consegue distinguir 8.000.000 de cores?

- Ouvido – Sabia que este consegue distinguir cerca de 300.000 sons?

- O corpo, no seu todo – Segundo o médico inglês F. E. Lawson, estas são as matérias-primas que entram na composição do corpo humano - de um homem de estatura normal - pesando cerca de 75 kg. Essas são:

1- “Água - cerca de 45 litros.
2- Gorduras - as suficientes para o fabrico de sete barras de sabão.
3- Carvão – que daria para fabricar 9.000 lápis vulgares.
4- Fósforo – que chega para fabricar 2.200 fósforos idênticos aos que usamos nas nossas casas.
5- Cal – que dá para pintar uma parede de 4 x 4 metros.
6- Enxofre – que chega para tirar as pulgas a um cão de tamanho médio.
7- Ferro – suficiente para se fazer meia dúzia de pregos. E ainda outras substâncias que não vale a pena enunciar”.

Portanto, apesar de sermos totalmente leigos na matéria, se juntarmos tudo, qual será o valor, em euros, deste ser humano acima descrito com cerca de 75 kg de peso? Será que este valerá, no seu todo, cerca de 50 euros? E no entanto, quão grande é o orgulho do ser humano!
Que máquina tão perfeita é a nossa, nós mesmos, não é verdade? Nós, uma maravilha da Criação de Deus! A única criatura formada - segundo as Escrituras – à Sua imagem e semelhança! Que grandiosa honra, que tremenda responsabilidade! Bendito seja o Seu eterno nome para sempre.
Muitos refugiam-se no argumento de que, por tudo ser tão, tão, tão simples e simplista, quiçá, infantil – logo, tudo é mito! Mas, repetimos, se o Senhor quisesse informar-nos, a partir da realidade, como muitos, inconscientemente, o desejam, então, teríamos inúmeras Bíblias para explicar a realidade e funcionamento de todas as coisas! Nomeadamente, o corpo humano, não é verdade?
E depois, só por estes elementos simples e complicadíssimos que apresentámos, será que mesmo neste limiar do século XXI, a ciência humana sabe como tudo isto se articula? Consegue compreendê-lo? O ser humano, uma máquina perfeitíssima e, no entanto – não passa de matéria perecível, simples! Não é mais do que o que as Sagradas Escrituras o revelam e definem – PÓ – nada mais! Que Deus, que Poder! Que o Seu excelso nome seja exaltado para todo o sempre.
Queremos tudo racionalizar, como se tudo fosse assim tão simples! Só queremos, para nossa comodidade, aceitar o que é racional e, por que não dizê-lo, o que é palpável concreto; caso contrário não o aceitamos. Tal como na religião, não é verdade? Aceitávamo-Lo se O víssemos, se O tocássemos, tal como Tomé – cf. S. João 20:25-29.
A este efeito contaremos uma pequeníssima história: - “Certa vez, um cosmonauta e um neurocirurgião russos discutiam sobre religião. O cirurgião era cristão, o cosmonauta não. «Eu já estive várias vezes no espaço», gabava-se o cosmonauta, «mas não vi Deus nem anjos». «E eu já operei muitos cérebros inteligentes», respondeu o cirurgião, «e também não encontrei em lado algum um único pensamento». Poderemos, prezado amigo leitor, desde já, tirar algumas conclusões?
Voltemos às palavras de Jesus ditas acima. No relato da Criação pensamos encontrar todas as respostas às Suas afirmações! Vejamos uma por uma:

 Quem é que esta personagem matou? Pensamos, se é que não estamos a exagerar ou a adulterar os textos, que a resposta estará associada ao assassinato de Abel – acção instigada por este ser que fomentou o orgulho e inveja em Caim, irmão de Abel – “(…) o pecado (…) tem muita inclinação para ti, mas deves dominá-lo (…). Caim lançou-se sobre o seu irmão e matou-o” - Génesis 4:7,8

 Que tipo de mentira disse? Os textos o testificam claramente! Deus, logo no início, admoesta as Suas criaturas, ordenando: “Não comas o fruto da árvore da ciência do bem e do mal, porque no dia em que o comeres, certamente morrerás” – Génesis 2:17 (sublinhado nosso). A certa altura, o relato inspirado dá-nos a conhecer que um animal - a serpente – fala, afirmando: “Não, não morrereis; mas Deus sabe que, no dia em que o comerdes, abrir-se-ão os vossos olhos e sereis como deuses, ficareis a conhecer o bem e o mal” – Génesis 3:4,5 (Algo de inacreditável! Uma serpente falar! Quem diria?! Teria sido ela ou alguém através dela? Mais à frente abordaremos esta problemática, isto é, os meios usados por este poder para enganar).

 Mentiu a quem? A Palavra de Deus refere que “A serpente, o mais astuto de todos os animais dos campos que o Senhor Deus fizera, disse à mulher: É verdade ter-vos Deus proibido comer o fruto de alguma árvore do jardim? (…)” – Génesis 3:1 (sublinhado nosso)

Portanto, à luz do ensino, a partir do relato bíblico, podemos conhecer e compreender o pleno significado das palavras de acusação de Jesus ao pretenso povo de Deus, a saber:

• No livro do Apocalipse 12:9, encontrámos a identificação desta “serpente”, anunciada desde o livro de Génesis.

• Através do relato da Criação compreendemos a comparação feita por Jesus, ao combater a hipocrisia do pretenso Povo de Deus e, nesta qualidade, indicou o verdadeiro patrono destes adoradores! Cf. - S. João 8:44.

• A mulher, o elemento mais sensível, foi enganada pelo mestre do disfarce e da mentira – Satanás - “pai da mentira”.

• A mentira que tem que ver com o orgulho humano – querer deixar a condição humana para reivindicar a divina – a Imortalidade!

Ninguém, nenhum ser vivente, por mais excelso e sublime que seja, tem este atributo. Segundo as Escrituras, só Deus o possui – “Aquele que é o único que possui a imortalidade e que habita na luz inacessível (…)” – I Timóteo 6:16.
Assim, na afirmação da serpente à mulher, estão contidas quatro afirmações de peso, a saber:

1- Não morrereis
2- Os vossos olhos se abrirão
3- Sereis como deuses
4- Conhecereis o Bem e o Mal - Génesis 3:4,5

Destas quatro afirmações só uma é falsa – a primeira! Eis o método no qual Satanás, o enganador, o acusador, é perito – misturar o Erro com a Verdade!
Ser como os deuses significa: ter autonomia, ser livre - mas não Deus! Já experimentámos voar? Experimentemos lançar-nos no espaço vazio para planarmos como um grande pássaro, aproveitando as correntes de ar quente que sobe; mas, ao longo da nossa descida, apesar de planarmos como um pássaro de grande envergadura, este acto não faz de nós um pássaro! Somos COMO, mas não O (pássaro)! E é aqui, prezado amigo, que reside toda a diferença! Assim, “ao tornar-se autónomo, o homem tronou-se «como um deus», mas não Deus; esta autonomia não o poderia conduzir senão à morte. Aqui reside toda a diferença e esta é de peso!”.
Adão e Eva esqueceram-se que, a sua dita – imortalidade – estava condicionada ao acesso à “árvore da vida” – Génesis 2:9; esta estava situada no meio do jardim. Aceitando a sua condição – de homem criado, dependente, - então poderia viver eternamente! Como poderá isto acontecer se nos afastarmos de Deus? É por isto que, biblicamente, o círculo é fechado. Recordemos o teor da sétima bem-aventurança, a última, contida no livro do Apocalipse, (1:3; 14:13; 16:15; 19:9; 20:6; 22:7,14) que diz: “Felizes os que lavam as suas vestes, para terem direito à Árvore da Vida, e poderem entrar, pelas portas, na Cidade” – Apocalipse 20:14 (sublinhado nosso). Em Cristo, o anterior privilégio é retomado!
Instigada pelo grande enganador – o Dragão, a antiga Serpente – a doutrina da Imortalidade da Alma, ainda hoje é, por estranho que possa parecer, ensinada pela maioria das confissões religiosas existentes em Portugal e que, certamente o autor não é alheio a tal ensino, o qual contraria frontalmente o claro ensino bíblico, como veremos mais abaixo, quando abordarmos esta problemática.
Portanto, repetimos, se o relato da Criação pertence ao mundo do mito, então as palavras de Jesus não têm qualquer sentido e, automaticamente, estão desprovidas de conteúdo e significado! Por isso, prezado leitor, uma vez mais, quanto a nós, preferimos ficar ao lado da Verdade – a Palavra de Deus.
Bibliografia:Jostein Gaarder, O Mundo de Sofia – Uma Aventura na Filosofia, 10ª ed., Lisboa, Ed. Presença, Edmond Jacob, Théologie de l’Ancient Testament, Suisse, Ed. Delachaux & Niestlé, 1968, p. 227, nota 1: O tema da serpente é comum a muitas religiões; mas enquanto que estas religiões sublinham, principalmente, o aspecto de força vital, o Antigo Testamento coloca em evidência o seu papel funesto (…). 996, p. 206
Jean Flori, Genèse ou l’Antimythe, Paris, Ed. SDT, 1980, p. 55
Joaquim Carreira das Neves, OFM, op. cit. p. 124.

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