Mais adiante voltaremos a este assunto, mas, para já, limitemo-nos a tecer umas breves considerações à forma, bastante sui generis, de abordar esta temática pelo autor (Dr. Carreira das Neves, padre e professor católico), como resposta ao seu interlocutor, o tal biblista (Pr. Ernesto Ferreira, ex-padre e Pastor Adventista de grande produção literária no âmbito da Teologia Bíblica) de outra confissão religiosa!
A certa altura da sua exposição diz “a liturgia politeísta estava cheia de estátuas de deuses e deusas; por isso não admira o alerta constante da Bíblia para tal perigo. Mas é esta a doutrina da Igreja Católica em relação às imagens do culto católico? De modo algum: tanto católicos como Adventistas só adoramos a Deus e mais ninguém.” Que afirmação mais espantosa, vinda de quem vem!
Mal seria se uma confissão religiosa, dita cristã, siga ela o credo que seguir, se não adorar a Deus! Cremos que o problema ou quaisquer divergências, deverão residir na forma desta mesma adoração! O autor ao continuar a sua exposição acrescenta: “As imagens, sejam elas da Virgem Maria ou dos Santos, têm tão-somente um valor de mediação ou de exemplaridade. Como humanos e históricos precisamos de sinais, de significantes e significados”.
Estas palavras não são inovadoras. Esta explicação faz-nos recordar as célebres palavras de Madame Sevigné quando exclamou: “Adensai-me a religião senão evapora-se toda”. Estas palavras não são mais do que o reflexo da pouca fé existente no pobre ser humano! Este, para a consolidar precisa de “sinais e de significantes”! Será que Deus não pode e deve ser adorado em toda a simplicidade, tal como as Escrituras o revelam “Deus é espírito, e os Seus adoradores em espírito e verdade é que O devem adorar” – S. João 4:24? De que tipo é a nossa fé para que só O possamos adorar através de um objecto de mediação?
Em continuação do seu raciocínio acrescenta: “Se eu olho para uma imagem ou pintura da Mãe do Senhor Jesus Cristo, lhe ofereço flores, incenso, cânticos, procissões, etc., não estou contra a Bíblia que proíbe apenas as imagens dos deuses ou de seres terrenos (animais, aves) humanos e celestiais (sol, lua, estrelas) que eram adorados, pois continuo a ser monoteísta, a adorar apenas a Deus, embora venere a Mãe do Senhor Jesus Cristo, nosso Salvador” . Que forma tão estranha de se expressar e desprovida de qualquer nexo! Esta é mais uma das expressões que, se não a lêssemos e vinda de quem vem, não acreditaríamos! Como é possível misturar tanta coisa numas simples frases? Que o ser humano adore ou venere… e aqui não diferenciaremos os termos, pouco importaria se não existisse a – Norma! Esta, não só nos dá a conhecer Deus, como de igual modo, a forma mais correcta para Lhe prestarmos culto! Passaremos a explicar-nos:
Como é possível um teólogo da craveira do autor dizer que “se à imagem da Mãe do Senhor Jesus Cristo, lhe ofereço flores, incenso, cânticos, procissões, não estou contra a Bíblia (…)”! Não percebemos, francamente, a que Bíblia é que, o prelado em causa, se refere?! Se é a mesma que estamos a pensar e a usar como base para as nossas citações e reflexões, então, algo está mal, muito mal! Vejamos, brevemente o que esta diz a este respeito:
a) “(…) Apenas madeira cortada na floresta, obra trabalhada pelo cinzel do artista. Adornada com prata e com ouro. A golpes de martelo e com pregos o fixam, para que se não mova. Estes deuses assemelham-se a espantalhos num campo de pepinos. Devem ser conduzidos, pois não caminham. Não os temais, porque não podem fazer mal, nem bem.” – Jeremias 10:3-5. (sublinhado nosso). Perguntamos: Haverá assim tanta diferença, com as imagens dos ditos “santos” que são colocados, ainda nos nossos dias, nos andores para serem transportados em procissão? Pensamos que não!
b) Este texto é extenso mas, pela sua beleza e clareza, transcrevêmo-lo tal qual: “Quem forma um deus, quem funde um ídolo, se não serve para nada? Olhai: os seus devotos serão confundidos, e os seus artistas são apenas homens. (…) O que trabalha em madeira, aplica a regra, faz o esboço a lápis, desbasta a imagem com o cinzel, mede-a com o compasso; dá-lhe figura de homem e beleza humana, para o pôr a habitar numa casa.
Cortam-se cedros, escolhe-se uma azinheira ou um carvalho (…).Para gente do povo serve-lhe de lenha, recolhem-na para se aquecerem ou também para cozer o pão; porém ele faz um deus para ser adorado, fabrica uma imagem para se prostrarem diante dela. Queima no fogo metade desta madeira, assa a carne sobre as brasas e come-as até se saciar. Depois aquece-se e diz:«Bom! Estou quente, sinto a chama!». Do resto faz um deus, um ídolo diante do qual se prostra adorando, e lhe roga: «Salva-me, porque tu és o meu deus»!
Eles não sabem nem compreendem; têm os olhos fechados e não vêem; Os seus corações não compreendem. Não reflectem, não têm bom senso nem inteligência para dizer: «Queimei metade da madeira, cozi pão sobre as brasas, assei carnes e comi-as. Vou agora fazer do resto um ídolo miserável? E prostrar-me diante de um pedaço de madeira»?” – Isaías 44:10-19.
Não será isto que, infelizmente, ainda se continua a fazer, apesar da advertência da Palavra de Deus?
c) “Congregai-vos e vinde, aproximai-vos todos juntos, sobreviventes dentre as nações! Nada disto compreendem os que trazem o seu ídolo de madeira e dirigem as suas súplicas a um deus incapaz de os salvar” - Isaías 45:20 Não continua a ser esta prática uma realidade? Por exemplo, nas festividades do 13 de Maio em Fátima e não só?
Antes de continuarmos, perguntamos: qual a diferença entre o relato bíblico e as imagens (ídolos) que o autor fala se, estas esculturas, na sua maioria, são feitas à imagem e semelhança do homem? Porque é que Deus as proibiu no passado e não proibiria as citadas pelo autor no presente? Cremos que estamos a lidar com um Deus justo e, acima de tudo, coerente! Aquele que é, tal como a Sua palavra o indica “(…) o Pai das Luzes, no Qual não há mudança nem sombra de variação.” – S. Tiago1:17
Dir-nos-á, prezado leitor: - afinal, sempre é a imagem da Mãe do Salvador, valha-nos Deus! Mas, com todo o respeito, perguntamos: - alguém foi testemunha ocular para que se tivesse feito essa tal imagem conforme o original, para que se adore ou venere? Respeitamos, pois, a boa vontade do autor, mas em nada está de acordo com as Escrituras e, por conseguinte, com a suprema vontade de Deus! Não se desloca esta imagem, que não corresponde a nada, sobre um andor, tal como o refere o texto do profeta Isaías acima exposto? Esta imagem, a exemplo da dos ídolos, feitos à imagem do homem ou do animal, quando se desloca em procissão, como no passado, para que não caia, precisa, de igual modo de “golpes de martelo e com pregos a fixem para que não se mova (ou caia), não é verdade?
Não seria bom que esta confissão religiosa tivesse em conta o que o profeta Isaías escreveu, tal como acima o transcrevemos, isto é: “Não reflectem, não têm bom senso nem inteligência para dizer: «Queimei metade da madeira, cozi pão sobre as brasas, assei carnes e comi-as. Vou agora fazer do resto um ídolo miserável? E prostrar-me diante de um pedaço de madeira»?”. Realmente, prezado leitor, como responder a tal pergunta? Como é que um ser inteligente consegue fazer o que o profeta descreve? Só um néscio faria tal coisa, não é verdade? Implicitamente é assim que o profeta cataloga todo aquele que o faz, embora nos custe admiti-lo! Nós não somos néscios e o prezado leitor também não! Por isso não o devemos fazer, pois segundo o raciocínio do profeta, esta atitude, de reverenciar uma imagem de escultura, é um insulto à nossa inteligência e, por extensão, ao próprio Deus inteligente, nosso criador!
E, para que não restem dúvidas acerca da estatuária, mesmo aquela de forma totalmente humana, leiamos o que o Salmo nos revela acerca destas que algumas confissões adoram ou veneram: ”Têm boca e não falam, olhos e não vêem, ouvidos e não ouvem, nariz e não cheiram; com as suas mãos não apalpam, com os seus pés não caminham; nem as suas gargantas emitem sons.” – Salmo 115 (114): 5-7. Aqui temos a descrição de um deus feito à imagem e semelhança do homem, nada mais do que isto – isento de poder, de vida, em suma - um vazio!
Gostaríamos de chamar à atenção para um pormenor interessante, o qual faz toda a diferença entre um deus e o verdadeiro Deus – a Palavra! Note o que diz o salmista para reforçar esta mesma ideia: 1- “têm boca mas não falam” – v. 5; 2- “nem as suas gargantas emitem sons” – v. 7.
Deus é o único da palavra: “que Deus se manifeste pela sua palavra (dabar), é uma verdade que confirma cada um dos livros do Antigo Testamento” . Observe-se, por exemplo, a força do texto sagrado quando refere: “Porque Ele falou e as coisas existiram. Ele mandou e as coisas subsistiram” – Salmos 33 (32):9. Quando Deus fala, Ele está presente com todo o Seu poder nas Suas palavras. É por esta razão que a força de uma palavra é sempre proporcional à daquele que a pronuncia; inversamente, se o que profere a palavra não tem força, esta última é vazia no seu significado.
Eis a grande diferença! Os ídolos feitos à semelhança do homem são como o vazio! “Inversamente, para designar o que não existe, a língua hebraica dirá simplesmente – lô dabar – ou empregar um dos muitos termos que significam: vazio, sem conteúdo e, consequentemente, sem força, sem eficácia. O ídolo, o deus de madeira é uma mentira, porque não pode salvar” .
Perante o exposto, voltamos a perguntar: qual a diferença entre estes deuses, a estatuária à semelhança do animal ou do ser humano, mesmo que esta imagem queira, com ternura, identificar Maria? Biblicamente falando, respondemos que: não existe - pura e simplesmente!
A estatuária de Maria, como já vimos, em nada corresponde ao original ali retratado! Logo, tal prática contraria a pessoa retratada como também favorece uma prática que é contrária ao que o Senhor deseja para o Seu verdadeiro povo e adoradores. Vejamos ainda mais algumas razões para fundamento do que continuamos a realçar:
Voltemos de novo às Escrituras; relativamente aos 10 mandamentos, pois não só Deus o proíbe desde logo no 2º (em particular) – cujo teor é: “Não farás para ti imagens esculpidas, nem qualquer imagem do que existe no alto dos céus, ou em baixo, na terra, ou do que existe nas águas, por debaixo da terra. Não te prostrarás diante delas e não lhes prestarás culto (…)” – Êxodo 20:4,5 (cremos que, em conformidade com o texto, a imagem da “suposta” Maria não é excepção), contrariamente ao que diz o autor e eminente teólogo!
Notemos a razão tremendamente clara e expressiva pela qual Deus proíbe as imagens que desejam retratá-Lo, apesar de piedosas: “O Senhor falou-vos, do meio do fogo; ouvistes o som das palavras, mas não vistes figura alguma. Era uma voz apenas. (…) Evitai, pois, de vos perverterdes, fabricando qualquer ídolo como representação ou símbolo do que seja, figura de homem ou de mulher.” – Deuteronómio 4:12,16. Perguntamos: como será possível representar, um abstracto SOM - sob a forma de estátua? Que aspecto terá este deus (ídolo)?! Mesmo que o queiramos, não o poderemos fazer, não é verdade?! Assim, desde logo, estamos automaticamente “proibidos” de fazer essa tal imagem que, vendo bem, o que é que representaria? Seria semelhante a quê e a quem?
É fácil fazer uma imagem de qualquer ser humano, por muito santo que seja, e mereça a nossa estima. Mas, por ser humano e pecador, não tem direito à veneração ou adoração, tal como o autor gosta de se expressar! Só a Deus, segundo as Escrituras se pode e deve adorar. Assim, quer seja a representação de Maria (que muito respeitamos) ou de qualquer santo, está, por conseguinte, excluída!
Outra razão pela qual Deus interdita ao homem fazer uma Sua imagem é, caso a anterior não bastasse, de que ao fazê-lo, estamos a limitar o Deus Todo Poderoso ao Tempo e ao Espaço do homem! Será possível que um pobre mortal, falho e pecador ouse fazer tal coisa? Um ídolo podemos manusear daqui para ali. De igual modo ele, apesar de inerte, comunga do nosso tempo. Mas, e Deus? Não somos nós ensinados que Ele é atemporal? O que é o tempo para Deus?
Santo Agostinho, a este propósito disse: “O que é, por conseguinte, o tempo? Se ninguém mo perguntar, eu sei; se o quiser explicar a quem me fizer a pergunta, já não sei. (…) De que modo existem estes dois tempos – o passado e o futuro –, se o passado já não existe e o futuro ainda não veio? Quanto ao presente, se fosse sempre presente, e não passasse para o pretérito, já não seria tempo mas eternidade”. Ou ainda, desta vez, acerca do binómio Tempo / Deus: “Dominais todo o futuro porque está ainda para vir. Quando ele chegar, já será pretérito (passado). Vós, pelo contrário, permaneceis sempre o mesmo e os vossos anos não morrem. Os vossos anos não vão nem vêm. Porém os nossos vão e vêm (…) o vosso «hoje» é a eternidade”.
É o que a Bíblia refere, só que não tão filosoficamente, quando diz que o dia e a noite, a luz e as trevas, para Deus são uma e única entidade: “Se eu disser: «ao menos as trevas me cobrirão, que a luz sobre mim seja qual noite», nem sequer as trevas serão bastante escuras para Vós, e a noite será clara como o dia; tanto faz a luz como as trevas.” – Salmo 139 (138):11,12; ou ainda “Mil anos, diante de vós, são como o dia de ontem que já passou, ou como uma vigília da noite” – Salmo 90 (89):4. O ser humano poderá ser orgulhoso, mas não ao ponto de querer limitar e reduzir Deus à dimensão humana! Nada de teologias esquisitas e complexas, pois a simplicidade dos textos nos farão ver o que, por razões várias e, quem sabe, bastante nobres, nunca prestámos atenção até ao presente momento, aos textos das Sagradas Escrituras a este respeito. Mas, lá diz o velho adágio: “Mais vale tarde do que nunca”, não é verdade?!
Para finalizarmos estas breves notas, francamente, não gostámos da forma como o autor terminou a resposta ao seu interlocutor (o biblista Adventista) acerca deste assunto. Na última linha remata desta forma deselegante ”Tudo o mais é bater no ceguinho”! Como académico, como prelado e, acima de tudo, como cristão que é, reconheçamos que tal postura não lhe fica nada bem!
Por outro lado, o que é que o autor acrescentou que pudesse, minimamente, rebater e esclarecer os ditos “erros” do seu interlocutor? Quanto a nós e pelo que acima expusemos, podemos concluir que, afinal, – nada disse!
O pouco que acrescentámos até aqui, não é, de forma alguma, “bater no ceguinho”, mas antes pelo contrário, dar luz a todos aqueles que tiveram a bondade de nos ler até aqui; para que possam ver, finalmente, a luz, o verdadeiro Caminho de Deus! Caminho expresso, não no ensino dos homens, sejam eles quais forem, sigam eles a confissão religiosa que seguirem, mas no quanto se encontra escrito na imutável Palavra do Senhor - “Conhecereis a verdade e a verdade libertar-vos-á” – S. João 8:32.
Liberta-nos, liberta-o de quê e de quem, prezado leitor? Certamente do engano daqueles que se dizem servos de Deus, mas cujo ensino e vivência estão longe do verdadeiro caminho de Deus preconizado pela sua Palavra!
Bibliografia:Jostein Gaarder, O Mundo de Sofia – Uma Aventura na Filosofia, 10ª ed., Lisboa, Ed. Presença, 1996, p. 206
Edmond Jacob, op. cit., p. 103.
Georges Pidoux, L’homme dans l’Ancient Testament, Cahiers Theologiques, nº 32, Genève, Ed. Delachaux & Niestlé, 1953, p. 37.
Santo Agostinho, Confissões, 11ª ed., Porto, ed. Apostolado da Imprensa, 1984, Livro XI, 14, p. 304
Joaquim Carreira das Neves, OFM, op. cit, p. 127.
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