"E outro anjo seguiu, dizendo: Caiu! Caiu Babilónia, aquela grande cidade que a todas as nações deu a beber do vinho da ira da sua prostituição!" (Apoc. 14:8).
Este anjo "seguiu" o primeiro, não no sentido de substituí-lo, mas sim no sentido de acompanhar ou complementar (como em Apoc. 14:4). A mensagem adicional menciona a "Babilónia" pela primeira vez em Apocalipse, e a descreve como a grande adúltera que seduziu as nações com vinho intoxicante. A mensagem do segundo anjo não pode entender-se adequadamente se se isola Apocalipse 14 do contexto que lhe seguir nos capítulos 16 a 18, nos quais é dada mais informação a respeito de Babilónia.
O outro realce para entender "Babilónia" é recuperar a sua relação com o Antigo Testamento. O nome "Babilónia" está escolhido de maneira intencional para revelar a relação teológica de tipo e antítipo com o arqui-inimigo de Israel durante o velho pacto. A queda histórica do império neo-babilónico, tal como Isaías, Daniel e Jeremias a predisseram, está decretado que seja o protótipo da queda de Babilónia do tempo do fim. Esta correspondência tipológica esclarece a interpretação da Babilónia do tempo do fim e de sua queda. Quando se estabeleceu a continuidade dos fundamentos teológicos de ambas as Babilónias, o Apocalipse proporciona a aplicação para o tempo do fim. Apocalipse 17 chama babilónia de "mistério" (V. 5), o que indica que a Babilónia do tempo do fim é a renovação apocalíptica da antiga cidade que se sentava sobre as "muitas águas" do Eufrates (Jer. 51:13). Uma comparação minuciosa revela a correspondência intencional:
Esta correspondência essencial das duas Babilónias está descrito pelo CBA nesta forma:
"A antiga cidade de Babilónia estava situada junto às águas do rio Eufrates (ver com. Jer. 50:12, 38), morava simbolicamente 'entre muitas águas' ou povos (Jer. 51:12, 13; cf. Isa. 8:7, 8; 14:6; Jer. 50:23), assim também a Babilónia moderna é apresentada sentada ou vivendo sobre os povos da terra, ou oprimindo-os (cf. com. Apoc. 16:12)".1
A frase "Babilónia a Grande" (mencionada 5 vezes: 14:8; 16:19; 17:5; 18:2, 21) é uma alusão direta à egolatria de Nabucodonosor em Daniel 4:30 (ver também Apoc. 18:7). As frases a respeito da queda de Babilónia e de seu vinho intoxicante em Apocalipse 14:8 estão tomadas dos oráculos de condenação do Antigo Testamento contra Babilónia (Isa. 21:9; Jer. 51:7):
Assim como a antiga Babilónia foi a perseguidora de Israel, assim também "Babilónia" no Apocalipse é a perseguidora do Israel de Deus no tempo do fim. Louis F. Were recalcou o caráter teológico de Babilónia: "Menciona-se Babilónia nas profecias do Apocalipse só devido a sua oposição à Jerusalém".2 Também A. Farrar comentou de maneira similar: "Babilônia é a paródia de Jerusalém".3
O contraste entre "Israel" e "Babilónia" que se descreve como duas mulheres, chega a ser ainda mais surpreendente quando se presta atenção à sua descrição detalhada. Enquanto a mulher de Deus no capítulo 12 aparece "no céu" iluminada com o sol e as estrelas, a mulher infiel do capítulo 17, adornada com as invenções do homem, "está sentada sobre muitas águas" e "sobre uma besta escarlate" (Apoc. 17:1-3). Enquanto a mulher do capítulo 12 leva um menino em seu seio a quem vai dar a luz, a mulher do capítulo 17 tem em sua mão um cálice cheio do sangue dos descendentes da outra mulher. A primeira mulher é protegida; a segunda pe destruída.
Não pode identificar-se Babilónia com Roma imperial. A grande "meretriz" que se senta "sobre uma besta escarlate" (Apoc. 17:3) é um símbolo que distingue Babilónia (a mulher) do poder político (a "besta"). Desde o começo, a característica essencial de Babel (literalmente, "porta dos deuses") foi elevar-se aos céus para usurpar o lugar e o poder soberano de Deus (ver Gén. 11:4; Isa. 14:13, 14; Jer. 51:53).
A intenção básica de Babilónia de representar a Deus sobre a terra segundo "sua vontade" (Dan. 11:36) é o mal mais fundamental. Esta aspiração demoníaca enfatiza-se na profecia do "chifre pequeno" do profeta Daniel (caps. 7 e 8) e do "rei do norte" (11:36-45). O objetivo perigoso de substituir tanto Deus como a sua redenção messiânica fica desmascarado na guerra que faz o chifre contra o "Príncipe dos príncipes", o verdadeiro Sumo Sacerdote de Deus, e contra o seu sacrifício todo suficiente (8:11, 25). Doukhan captou esta relação de Babilónia com o livro de Daniel com uma percepção aguda. Diz Doukhan:
"A ambição de Babel é idêntica à do chifre pequeno. Tem uma natureza religiosa e está dirigida à posição do Sumo Sacerdote em relação com a purificação e o juízo. Dessa maneira, luta por conseguir tanto o poder para perdoar pecados como o fim último para decidir a respeito da salvação (ver Lev. 16:19, 32)".4
O segundo anjo anuncia que Deus julgou a Babilónia e suas reivindicações religiosas de representar a Deus na terra. A queda repentina de Babilónia é o veredicto judicial de Deus. Sua proclamação tenta admoestar os seguidores da besta e os adoradores de sua imagem para saírem de Babilónia. Isto se repete na mensagem do anjo de Apocalipse 18:1-5. Babilónia deve definir-se teologicamente por sua oposição a Israel, o verdadeiro povo de Deus, o que dá a entender que a mensagem do primeiro anjo é o que dá origem ao Israel do tempo do fim (14:6, 7). As mensagens proféticas de Apocalipse 14 antecipam um conflito renovado entre "Israel" e "Babilónia" para o tempo do fim, com o entendimento básico de que tanto os adoradores verdadeiros como os falsos são identificados teologicamente por sua relação com o evangelho eterno.
O cativeiro de Israel levada a cabo pela Babilónia da antiguidade, a repentina queda de Babilónia seguida pelo êxodo do Israel de Babilónia e sua volta a Sião para restaurar a verdadeira adoração em um templo novo, tudo isto será repetido em princípio em uma escala universal. No tempo do fim Deus chamará a seu povo que está disperso em Babilónia:
"Sai dela, povo meu, para que não sejas participante dos seus pecados e para que não incorras nas suas pragas. Porque já os seus pecados se acumularam até ao céu, e Deus se lembrou das iniquidades dela." (Apoc. 18:4, 5).
Esta chamada é a iniciativa de Deus para restaurar a sua igreja remanescente, o povo mencionado em Apocalipse 12:17 e 14:12. Os verdadeiros adoradores devem abandonar "Babilónia", a igreja infiel que usa os "reis" ou poderes políticos para perseguir as "testemunhas de Jesus" (ver Apoc. 17:3-6; 18:24). Os santos devem fugir de Babilónia antes que chegue a hora de sua destruição, quer dizer, antes que o juízo de Deus assente um golpe a todos os que tenham a marca da besta (16:1, 2). Esta chamada a "fugir" de Babilónia é paralela com o conselho anterior que Jesus deu aos seus discípulos a "fugir" da cidade condenada de Jerusalém (Mat. 24:15, 16). A Babilónia a iguala explicitamente com a adoração idólatra no fim da era da igreja (ver Apoc. 16:1, 2, 19; 18:4, 8). A destruição de Babilónia descreve-se como um juízo retributivo, por causa do seu crime de perseguir e executar os santos de Deus:
"Exultai sobre ela, ó céus, e vós, santos, apóstolos e profetas, porque Deus contra ela julgou a vossa causa" (Apoc. 18:20).
"Aleluia! A salvação, e a glória, e o poder são do nosso Deus, porquanto verdadeiros e justos são os seus juízos, pois julgou a grande meretriz que corrompia a terra com a sua prostituição e das mãos dela vingou o sangue dos seus servos" (Apoc. 19:1, 2).
O anúncio profético do segundo anjo, "Caiu, Babilónia, a grande cidade" (Apoc. 14:8), está tomado da profecia de Isaías contra a antiga Babilónia:
"Caiu, caiu Babilónia; e todas as imagens de escultura dos seus deuses jazem despedaçadas por terra" (Isa. 21:9).
A queda de Babilónia foi o juízo de Deus pela sua usurpação da soberania divina e a perseguição cruel ao povo do pacto (ver Isa. 14:12-15; 13:11, 19; 14:3). As profecias de condenação de Isaías foram ampliadas pelo profeta Jeremias, que declarou os cargos legais de Deus contra Babilónia (Jer. 50, 51).
Isaías e Jeremias predisseram a queda de Babilónia como uma verdade profética. Entretanto, seu anúncio do veredicto de Deus chegou a ser a verdade presente para Israel no cativeiro. De igual maneira Daniel explicou a escritura na parede do palácio de Babilónia: "TEKEL: Pesado foste na balança e achado em falta" (Dan. 5:27). Este veredicto judicial foi uma realidade presente para Daniel e para Babilónia! O profeta experimentou o que tinha anunciado: o desaparecimento de Babilónia (v. 30; ver 2:38, 39).
O veredicto de Deus no céu foi a causa verdadeira da queda subsequente de Babilónia. Jeremias tinha mencionado que a condenação de Babilónia por parte de Deus estava motivada peça sua fidelidade ao pacto com Israel, ainda que o seu povo também era culpado:
"Porque Israel e Judá não enviuvaram do seu Deus, do Senhor dos Exércitos; mas a terra dos caldeus está cheia de culpas perante o Santo de Israel...
"Assim diz o Senhor dos Exércitos: Os filhos de Israel e os filhos de Judá sofrem opressão juntamente; todos os que os levaram cativos os retêm; recusam deixá-los ir; mas o seu Redentor é forte, Senhor dos Exércitos é o seu nome; certamente, pleiteará a causa deles, para aquietar a terra e inquietar os moradores da Babilónia" (Jer. 51:5; 50:33, 34).
O veredicto de Deus sobre a antiga Babilónia, um ato da sua fidelidade ao pacto, encontra um paralelo na mensagem do tempo do fim de Apocalipse 14:8. João acrescenta à declaração: "Caiu Babilónia", um chamamento profético para escapar à condenação de Babilónia (ver Apoc. 18:4, 5). O período intermediário entre a proclamação e a destruição de Babilónia do tempo do fim é o tempo para que Israel espiritual fuja de Babilónia. Desse modo, a história antiga de Israel proporciona a fonte e o antecedente das mensagens do tempo do fim do Apocalipse.
A mensagem cifrada que anuncia que Babilónia a Grande caiu, só será ativada depois que o evangelho apostólico tenha sido reavivado no tempo do fim (Apoc. 14:6). A interacção entre as mensagens dos dois primeiros anjos de Apocalipse 14, estendem-se de forma gradual a todas as nações. Estes anjos traçam a linha de batalha entre Israel e Babilónia. Esta é identificada pela oposição à mensagem do primeiro anjo, quer dizer, por sua oposição tanto ao evangelho eterno como à lei sagrada do Criador.
A queda de Babilónia pode entender-se a dois níveis. Primeiro, como o veredicto judicial pronunciado no céu, e segundo, como a sua condenação na história. A Babilónia do tempo do fim falha moralmente quando recusa o evangelho eterno. Este ato converte-a em "habitação de demónios" (Apoc. 18:2). Nesse momento, os seus pecados "chegarão até o céu" e alcançará o limite da graça divina (v. 5; Jer. 51:9). Então o tribunal celestial decidirá o castigo de Babilónia (ver Dan. 7:9-12).
Enquanto a mensagem do segundo anjo chama a atenção para o veredicto pronunciado no céu com respeito à culpabilidade de Babilónia, ainda se retarda a terminação do tempo de graça. O "vinho" de Babilónia, por meio do qual se intoxicaram todas as nações da terra, refere-se ao que parece aos ensinos doutrinarios de Babilónia, com os quais corrompeu o evangelho eterno e os mandamentos de Deus (ver Apoc. 14:12).
É útil considerar por meio de que causa imediata caiu a Babilónia da antiguidade. O rei Belsazar tinha ordenado o uso dos copos sagrados de ouro do templo de Israel para beber vinho no banquete imperial (Dan. 5:2, 3, 23). Nesse ato de profanação, os governantes de Babilónia "deram louvores aos deuses de ouro, de prata, de bronze, de ferro, de madeira e de pedra" (v. 4). Este ato idólatra de provocação ao Deus de Israel marcou o fim do tempo de graça para Babilónia e trouxe o veredicto de sua condenação (v. 24). O Apocalipse mostra que a Babilónia do tempo do fim tem um cálice de ouro na mão, "cheio de abominações e da imundície de sua fornicação" (Apoc. 17:4).
E porque finalmente tem levado "a beber a todas as nações do vinho da fúria da sua prostituição", cairá da graça protetora de Deus (Apoc. 14:8). Quando se bebe esse "vinho", a distinção fundamental entre o Criador e a criação, entre o santo e o profano, chega a ficar impreciso na mente das pessoas. Os adoradores da besta honrarão as criaturas mais que o Criador, o que é a essência da idolatria (ver Rom. 1:25; 1 Tes. 1:9). Em sua confusão a respeito da distinção estabelecida pelo Criador, os homens são levados a confiar em tradições humanas e no poder político para assegurar a paz.
O juízo retributivo das sete últimas pragas ainda é um juízo futuro para Babilónia. A advertência da mensagem do segundo anjo (Apoc. 14:8; 18:1-5) tem a sua relevância final para a geração que viva quando descerem as pragas sobre Babilónia (ver Apoc, 18:4, 5). Deste modo, as mensagens dos três anjos estão num marco explícito do tempo do fim.
Hans K. LaRondelle
Referências
1. 7 CBA 863. Ver também a "nota adicional" sobre Babilônia em 7 CBA 879-882.
2 Were, The Fall of Babylon in Type and Antitype, p. 14.
3 Farrar, A Rebirth of Images, p. 213.
4 Doukhan, Daniel: The Vision of the End, p. 66.
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