O Concílio de Laodicéia ocorrido em 364 d.C., discutira na ocasião sobre o dia de guarda que o cristianismo deveria seguir. Essa assembléia eclesiástica motivada em parte pela vigência do edito de Constantino(a)estabeleceu no cânon 29: “Os cristãos não devem judaizar e descansar no sábado, mas trabalhar neste dia; porém devem honrar especialmente o dia do Senhor, e, como cristãos, devem se possível, não realizar nenhum trabalho neste dia. Se, entretanto, forem encontrados judaizando sejam excomungados por Cristo.”1 Analisando este cânon verifica-se que:
Em meio a crescente apostasia dentro do cristianismo houve cristãos que não se curvaram as falsas doutrinas e permaneceram leais aos ensinos bíblicos. Eles obedeciam integralmente aos Dez Mandamentos como Cristo lhes ensinara;
A obediência desses cristãos ao quarto mandamento, que apresenta o sábado (sétimo dia da semana) como o “dia do Senhor”(b) , causou desconforto e promoveu a ira daqueles que decidiram considerar o domingo (primeiro dia da semana) como dia santo;
Esse cânon não objetivava, unicamente, substituir o verdadeiro dia de repouso instituído por Deus, pois determina também perseguição aqueles que seguissem com a observância sabática no sétimo dia.
Líderes religiosos envolvidos por falsas doutrinas apoiaram-se no decreto do imperador Constantino promulgado em 321 d.C. e, em outras leis dominicais estabelecidas em anos subsequentes, para redigir o cânone 29 do Concílio de Laodicéia e assim impor a substituição do dia de descanso semanal instituído por Deus (Êxodo 20:8-11). Adiante alguns comentários sobre estas questões:
“(…) domingo, diem solis, em conformidade com a expressão popular, era necessário para distinguir o dia na abordagem dos pagãos. Durante as eras iniciais da igreja nunca foi intitulado ‘o sábado’; esta palavra está restrita ao sétimo dia da semana, o Sábado Judaico, que, como já dissemos, continuou a ser observado por vários séculos pelos convertidos ao cristianismo.”2
“Embora quase todas as igrejas em todo o mundo celebrem os sagrados mistérios no sábado de cada semana, os cristãos de Alexandria e de Roma, em vista de alguma antiga tradição, cessaram de fazer isso.”3 ”O povo de Constantinopla e de outras cidades, congregam-se tanto no sábado como no dia imediato; costume esse que nunca é observado em Roma.”4
“Os celtas tinham seus próprios concílios e decretavam suas próprias leis, independente de Roma. Os celtas usavam uma Bíblia latina diferente da Vulgata, e guardavam o sábado como dia de repouso, com serviços religiosos especiais no domingo.”5
“É certo que o próprio Cristo, Seus apóstolos e os cristãos primitivos em um considerável espaço de tempo observaram constantemente o sábado do sétimo dia; os evangelistas e São Lucas em Atos sempre referem-se ao dia de sábado, delineando a sua solenidade pelos apóstolos e outros cristãos. (…) O sábado do sétimo dia foi solenizado por Cristo, pelos os apóstolos e pelos cristãos primitivos,até que a assembléia de Laodicéia de certa forma aboliu a sua observância. (…) O Concílio de Laodicéia, 364 d.C., estabeleceu primeiramente a observação do dia do Senhor [domingo], e proibiu a guarda do sábado judaico sob anátema.”6
“Pouco precisa ser dito sobre a mudança do sétimo para o primeiro dia da semana. Os primeiros discípulos conservavam ambos os dias: o Sábado para o descanso, o Domingo para o trabalho. A Igreja Cristã não realizou de forma oficial, mas gradual e quase inconscientemente, a transferência de um dia pelo o outro.”7
“A oposição ao judaísmo introduziu o particular festival do domingo muito cedo, na verdade, no lugar do sábado. (…) A festa dominical como todas as outras festividades, sempre foi uma ordenança unicamente humana, e estava longe das cogitações dos apóstolos estabelecer a este respeito uma ordem divina; longe deles e da primitiva igreja apostólica transferir para o domingo as leis do sábado.”8
“No intervalo entre os dias dos apóstolos e a conversão de Constantino, a comunidade cristã mudou seu aspecto. O bispo de Roma, um personagem desconhecido para os autores do Novo Testamento, nesse intervalo de tempo, finalmente conseguiu a primazia de todos os outros clérigos. Ritos ecerimônias, na qual Paulo nem Pedro nunca ouviram, foram usadas soradeiramente e silenciosamente, e, em seguida, firmadas como instituições divinas.”9
“Da época dos apóstolos até o Concílio de Laodicéia, que ocorreu por volta do ano 364, a sagrada observância do sábado dos judeus persistiu, como pode ser comprovada por vários autores; de fato, apesar do decreto desse concílio em oposição à ela.”10
Fatores como: a infiltração de ensinos pagãos no cristianismo; a criação do obscuro “festival da ressurreição”; o ódio de alguns cristãos pelos judeus; a lei civil decretada pelo edito de Constantino; e, a ânsia da Igreja de Roma em substituir o sábado pelo domingo, resultaram em caos quanto ao dia de descanso que deveria ser seguido no cristianismo. Esse impasse entre a guarda sabática e dominical ocasionou a observância de ambos os dias por muito tempo. É nesse ambiente conturbado que o Concílio de Laodicéia regulamenta o cânon 29.
A guarda do domingo como o “dia do Senhor” não é bíblica, e não era seguida pelos primeiros cristãos da Igreja Primitiva. Se a observância dominical fosse algo definido, fato estabelecido no cristianismo na época de Jesus e de Seus discípulos (como alguns sem base bíblica e histórica alegam) então, por que o Concílio de Laodicéia legislou proibindo o descanso sabático entre os cristãos em suas sessões no século IV? Para que invocar o sábado se ele fora cancelado na cruz e ninguém o observava? É inegável que o conclave traçou diretrizes a respeito do dia de guarda objetivando substituir o sétimo dia (descrito no quarto mandamento) pelo primeiro dia da semana.
Abrangência do Concílio de Laodicéia
Existe no meio protestante, àqueles que se esforçam para minimizar a autoridade do Concílio de Laodicéia argumentando: que ele se realizara no Oriente e não em Roma; que a cidade de Laodicéia era grega e não romana; que a Igreja de Roma não estava presente; que era concílio local, sem amplitude; entre outros pretextos esdrúxulos e inúteis. Na realidade essas pessoas não menosprezam somente os registros e as implicações do Concílio de Laodicéia, mas, qualquer fato histórico que prove a origem pagã da observância dominical.
A ocorrência de um concílio fora de Roma nada significa contra a sua autoridade porque, os primeiros concílios locais e gerais que estabeleceram as doutrinas e diretrizes eclesiásticas da Igreja Romana foram realizados na Turquia (Ásia Menor), tais como os: Concílios de Nicéia; Concílios de Constantinopla; Concílio de Éfeso e o Concílio de Calcedônia. Os demais ocorreram na Europa a partir do Concílio de Latrão (1123 d.C.); e, na cidade de Roma, somente os Concílios de Trento e do Vaticano. O fato da maioria dessas assembléias terem sido realizadas fora de Roma não enfraquece a autoridade de suas decisões para os fins que foram estabelecidas.
A afirmação de que o Concílio de Laodicéia foi local sem amplitude revela ignorância dos fatos, pois, todas as decisões tomadas em seus sessenta cânones, foram totalmente ratificadas e oficializadas pelo cânon 01 do Concílio (Geral) de Calcedónia,11 demonstrando a autoridade e a universalidade da assembléia laodiceana: “Os cânones até esta data publicados pelos santos pais em todos os sínodos terão validade.”12
“Além de reforçar os cânones dos concílios anteriores da igreja, bem como as declarações de algunssínodos locais, o concílio [de Calcedônia] emitiu decretos disciplinares destinados a monges e clérigos e, declarou patriarcadas(c) Jerusalém e Constantinopla. O efeito global foi para dar à igreja um caráter institucional mais estável.”13 ”O concílio [de Laodicéia] foi composto por 32 bispos das províncias da Ásia e os resultados das decisões produziram 60 cânones que foram pronunciados como credos obrigatórios aos cristãos em todo o mundo pelo Concílio de Calcedônia em 451.”14
Pode-se destacar ainda que, o Concílio de Laodicéia teve legitimidade em estabelecer quais livros pertenceriam a Bíblia, eliminando do seu catálogo os livros apócrifos.15 Na ocasião o livro do Apocalipse não foi aceito, porém, fora incluído posteriormente no Concílio de Cartago (ocorrido na África) em 397 d.C. Essas medidas de aplicação universal também foram confirmadas pelo Concílio Geral de Calcedônia.
Através desses dois concílios locais (Laodicéia e Cartago) realizados fora do território de Roma e com pequena representatividade da Igreja Romana é que, os protestantes (especialmente os que se contorcem para desmerecer as implicações e a universalidade do Concílio de Laodicéia), possuem hoje suas Bíblias em ordem com todos os livros inspirados e, excluídos os deuterocanônicos (apócrifos). Lembrando que, na contra-reforma, a Igreja de Roma voltou a utilizar os apócrifos com o intuito de combater o protestantismo.
Existe ainda um fato interessante vinculado a esses acontecimentos que ilustra a relação entre os poderes político e religioso da época e que, se repetirá nos eventos finais que antecedem a segunda vinda de Cristo(d): o imperador Justiniano I, após tomar conhecimento das ratificação de decisões eclesiásticas referentes aos cânones adotados pelos primeiros quatro concílios gerais, incorpora-os em sua Novela 131 (Nouellae 131), que era as normas constitucionais do império ou o código imperial com força de lei civil. E a infração contra essas normas era considerada crime contra o Estado.
Considerações Finais
É inevitável e irrefutável a conclusão de que a igreja apostatada foi a responsável pela mudança da observância sabática pela dominical. Essa alteração ocorreu gradualmente através de leis civis e eclesiásticas que surgiram sob a tutela da Igreja Romana(e) e, como o livro de Daniel descreve, essa instituição religiosa cuidou em “mudar os tempos e a lei” (Daniel 7:25). E o fez com maestria, embora a longo prazo (cf Marcos 7:7-9).
Os catecismos romanos estão repletos de citações que reconhecem a autoridade da Igreja de Roma como responsável pela mudança do dia de repouso. O fato essencial é que tal mudança não tem aprovação das Escrituras Sagradas. Ao contrário, tem fundamento unicamente na tradição enraizada no paganismo. E não constitui regra de fé e prática. Deve, pois, ser rejeitada.
Texto baseado em: CHRISTIANINNI, A. B. (1981). Subtilezas do Erro, 2.ª ed., cap. 38, p. 241-246.
Vídeos relacionados: O Sétimo Dia – Programa 04; O Sétimo Dia – Programa 05
a. Acesse: A Guarda Dominical e o “deus Sol”
b. Acesse: “O dia do Senhor”
c. Sob jurisdição; subordinadas a Igreja Romana.
d. Acesse: Babilônia Denunciada – II
e. Acesse: Do Sábado para o Domingo
1. HEFELE, C. J. (1876). A History of the Councils of the Church: From the Original Documents, vol. II, Edinburg: T. & T. Clark, book VI, sec. 93, p. 316.
2. COLEMAN, L. (1852). Ancient Christianity, Philadelphia: Lippincott, Grambo & CO., chap. XXVI, sec. II, p. 529; (Lyman Coleman foi escritor, professor de idiomas (latim e grego) e pastor da Igreja Congregacional).
3. SOCRATES. Ecclesiastical History, book V, chap. XXII; (obra do historiador grego e cristão Sócrates, o Eclesiástico. Ela é composta por sete livros e discorre sobre os acontecimentos da Igreja de Roma entre 305-439 d.C.; abrangendo fatos políticos e eclesiásticos, tanto internos como externos). Too in: SCHAFF, P.Nicene and Post-Nicene Fathers: Socrates and Sozomenus Ecclesiastical Histories, series II, vol. II, p. 334.
4. SOZOMEN. Ecclesiastical History, book VII, chap. XIX; (esta obra foi elaborada pelo Salminius Hermias Sozomenus, Sozomen, e descreve a história da igreja baseada nas obras literárias de Sócrates, o Eclesiástico e de Eusebius, bispo de Cesarea). Too in: SCAFF, P. ob. cit., p. 874.
5. FLICK, A. C. (1964). The Rise of the Mediaeval Church and its Influence on the Civilisation of Western Europe from the First to the Thirteenth Century, New York: Ayer Publishing, chap. XII, p. 237. Too in: BELLESHEIM, A. (1887). History of the Catholic Church in Scotland, vol. I, p. 86.
6. PRYNNE, W. (1633). Dissertation on The Lord’s Day, p. 33, 34, 44; (William Prynne foi advogado, escritor e membro da Igreja Presbiteriana). Too in: ANDREWS, J. N. (1862). History of the Sabbath and First Day of the Week, p. 265; UTTER, G. B. (1913). The Sabbath Recorder, vol. 74, American Sabbath Tract Society, p. 616a.
7. FARRAR, F. W. (1892). The Voice from Sinai: The Eternal Bases of the Moral Law, New York: Thomas Whittaker, p. 152; (Frederic William Farrar foi escritor e filósofo inglês; membro da Igreja Anglicana, fez parte do corpo eclesiástico da Abadia de Westminster e em 1883 foi nomeado arquidiácono).
8. NEANDER, A. (1843). The History of the Christian Religion and Church: During the Three First Centuries, Philadelphia: James M. Campbell & CO., p. 186a.
9. KILLEN, W. D. (1859). The Ancient Church, London: James Nisbet & CO., p. vi (Preface); (foi professor de História Eclasiástica e diretor da Faculdade Teológica Presbiteriana da Irlanda).
10. LEY, J. (1641). Sunday, a Sabbath: Preparative Discourse for Discussion of Sabbatary Doubts, London: Printed by R. Young for George Lathum, p. 163; (foi clérigo da Assembléia de Westminster, presidente do “Sion College” e reitor das universidades de Ashfield e Astbury).
11. Laodicea, Synod of. (1911). Encyclopædia Britannica, vol. XVI, England: Cambridge University Press, p. 189b.
12. HEFELE, C., J. (1883). A History of the Councils of the Church: From the Original Documents, vol. III, Edinburg: T. & T. Clark, book XI, sec. 200, p. 385.
13. Chalcedon, Council of. (2010). Encyclopædia Britannica. Chicago: Encyclopædia Britannica.
14. Laodicea, Council or Synod of. (1919). The Encyclopedia Americana, New York, Albany: J. B. Lyon Company, vol. XVI, p. 739b. Too in: Laodicea, Synod of. (1911). Encyclopædia Britannica, vol. XVI, England: Cambridge University Press, p. 189b.
15. PEREIRA, C. E. (1949). O Problema Religioso na América Latina: Estudo Dogmático Histórico, 2.ª ed., São Paulo, p. 78. Quoted in: CHRISTIANINNI, A. B. (1981). Subtilezas do Erro, 2.ª ed., p. 244.
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