Qual é o significado teológico dos selos e das trombetas? O
conteúdo de cada série mostra que está dirigido a diferentes classes de
pessoas. Os selos se centram sobre os mártires que foram mortos por causa de
seu testemunho à Palavra de Deus e o testemunho de Jesus durante a era da
igreja (Apoc. 6:9-11). Seu clamor, "Até quando...?", indica que a
perseguição contra os cristãos continuou por um tempo prolongado. Os primeiros
4 selos predizem as perseguições dos cristãos devidos à sinagoga (2:9; 3:9) e a
Roma pagã (1:9; 2:10, 13).
O quinto selo estende a perseguição dos santos além da Roma
imperial até que termine a tribulação final (Apoc. 6:11; 7:14). A frase do
anjo: "Que descansassem ainda um pouco de tempo", corresponde ao
"pouco tempo" atribuído ao diabo em Apocalipse 12:12, e também se estende
até a segunda vinda de Cristo. Os selos ensinam que o discipulado de Cristo
inclui sofrer por Cristo (ver Apoc. 1:9). Leão Morris expressou bem esta lição:
"As palavras de João [em Apoc. 6:9] são um recordativo
de que através da história houve uma hostilidade persistente por parte dos que
exercem o poder para os cristãos profundamente comprometidos. Manifesta-se
hoje, como em outros períodos, e será assim até o fim do tempo".1
Mas o Cordeiro que abre cada selo do livro é ao mesmo tempo
o Leão vencedor da tribo do Judá (Apoc. 5:5; 6:1). Ele está em pé ao fim dos
selos para julgar a todos os homens (6:15-17; cf. Mat. 25:31-46). O reino da
glória vem só depois da grande tribulação (Apoc. 7:9-17). A existência cristã é
viver com a tensão do sofrimento e a esperança do reino de Cristo. Graeme
Goldsworthy observa com perspicácia:
"Reflete o sofrimento do Cordeiro e antecipa a
consumação do reino por meio da vitória do Leão".2
O quinto selo consola os que se sacrificam a si mesmos por
causa de Cristo. O clamor dos mártires não é por uma vingança encarniçada mas
sim pela vindicação de sua fé em Deus e na causa de Cristo pela qual foram
mortos.
Os mártires esperam a execução da justiça sobre "os que
moram na terra". Os juízos descritos nos selos não devem entender-se como
juízos diretos de Deus, mas sim como as ações malvadas dos perseguidores,
"os moradores da terra", um termo usado no Apocalipse como um termo
técnico para designar a todos os que sucumbiram à adoração idolátrica (Apoc.
13:8, 12; 17:2, 8). O clamor dos santos não se dirige a alguns juízos
preliminares a não ser ao pronunciamento final do juízo de Deus em seu favor.
Solicitam o cumprimento disposto da cena do juízo de Daniel:
"Eu olhava e eis que este chifre fazia guerra contra os
santos e prevalecia contra eles, até que veio o Ancião de Dias e fez justiça
aos santos do Altíssimo; e veio o tempo em que os santos possuíram o
reino" (Dan. 7:21, 22; ver também Deut. 34:23).
Os mártires assassinados até estão clamando hoje a Deus para
que cumpra suas promessas. Tais orações persistentes reclamando justiça dão por
sentado a fidelidade de Deus, "o Senhor santo e verdadeiro" (Apoc.
6:10). A mensagem dos selos denota que Cristo decide quem são os herdeiros
legítimos do reino de Deus, quais a sua vista constituem o verdadeiro
"povo dos santos do Altíssimo", e a quem "o reino e o domínio e
a majestade debaixo de todo o céu" será dado (Dan. 7:27). Este assunto
fundamental é a preocupação pastoral de todo o Apocalipse.
Na visão introdutória das trombetas, João viu como "as
orações de todos os santos" sobre a terra subiam diante de Deus com a
fumaça do incenso celestial (Apoc. 8:3, 4). O céu responderá a essas orações
dos santos que sofrem arrojando "fogo" do altar à terra. Isto
representa juízos específicos que limitam ou incapacitam os poderes
perseguidores do mundo até que os juízos universais trazem a destruição final.
Daniel disse ao rei de Babilónia que o Deus de Israel "muda os tempos e as
estações; tira reis e põe reis" (Dan. 2:21). Esta soberania ativa de Deus
se declara simbolicamente por meio das 7 trombetas da época da igreja. As
apresentações das trombetas recordam especialmente as pragas do Egito. Deus enviou
as 10 pragas em resposta ao clamor de seu povo: "ouvi seu clamor..."
(Êxo. 3:7), o que nos recorda que os juízos de Deus se derramam em defesa de
seu povo do pacto. Isto é patente especialmente se compararmos a quinta
trombeta com o quinto selo.
Enquanto o quinto selo (Apoc. 6:9-11) centra-se sobre a
petição dos santos martirizados, a quinta trombeta descreve os juízos sobre o
mundo incrédulo, só sobre os que não têm "o selo de Deus em suas
frontes" (9:4). As 3 últimas trombetas inclusive se caracterizam como
"ais" para "os habitantes da terra", a população ímpia do
mundo (11 :10; 13:8, 12; 17:2, 8).
Este contraste básico entre os selos e as trombetas indica
que as duas sequências proféticas se enfocam sobre diferentes pessoas, enquanto
se comparam mutuamente. Ambas as séries são complementares. Juntas formam um
quadro mais completo da era da igreja. Enquanto os selos levantam a questão
inquietante do por que Deus parece ser tão passivo a respeito da sorte de seu
povo açoitado, as trombetas asseguram que Cristo está comprometido ativamente
no mundo. Alcança a seus inimigos até que se termina sua paciência. Seu juízo
chega a ser definitivo com a sétima trombeta, quer dizer, com as 7 pragas.
As trombetas apontam para trás à liberação de Israel do Egito.
O propósito das pragas do Egito era convencer a Faraó que significavam "o
dedo de Deus" (Êxo. 8:19) e que devia deixar ir a Israel para que
adorassem a seu Deus (10:7). De igual maneira, o propósito dos juízos das
trombetas é convencer ao mundo ímpio que Cristo está a favor de seu povo e
chama todos os homens a que se arrependam. Michael Willcock assinalou este
aspecto das trombetas:
"Os selos mostraram à igreja sofredora suplicando para
que se faça justiça. Mas as trombetas mostram que se oferece misericórdia ao
mundo ímpio. A oferta não é aceita, e de fato, o mundo não se arrependerá
(Apoc. 9:20 e seguintes); mas nunca poderá dizer-se que Deus não fez tudo o que
estava em suas mãos, inclusive até a devastação de sua terra uma vez perfeita,
para fazer entrar em razão aos homens".13
Esta exortação ao arrependimento sobre os inimigos do povo
de Cristo é o significado teológico dos selos e das trombetas.
Referencias:
1. Morris,
The Revelation of St. John, p. 108.
2. Graeme
Goldsworthy, The Lamb and the Lion. The Gospel in Revelation [O Cordeiro
e o Leão. O Evangelho no Apocalipse] (Nashville: T. Nelson Publishers, 1984),
p. 33.
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